O grande acontecimento político do final de semana não é a adesão de Marina ao PSB e sim sua saída (a confirmar) da corrida presidencial. O acordo político firmado aponta para uma chapa encabeçada por Eduardo Campos. Portanto, a segunda colocada nas pesquisas até aqui se retirou da disputa. Essa é a grande novidade da política nacional. Temos, assim, uma alteração significativa do cenário pré-eleitoral, mas o sentido dessa mudança e os eventuais prejuízos aos demais candidatos é incerto. Ainda é cedo para assertivas definitivas e análises políticas precipitadas costumam custar caro.

Assim, cumpre observar com alguma cautela os últimos acontecimentos, algo impensável para boa parte dos articulistas da grande mídia, em função de sua inebriante torcida para que tudo sirva ao propósito fundamental de derrotar o PT. Essa turma, por sinal, já errou inúmeras vezes ao longo dos últimos anos.

O fato é que há elementos suficientes para, no mínimo, problematizarmos a tese de que Eduardo Campos operou uma “jogada de mestre” no último sábado. Claro que o episódio, em si, foi relevante. Mas isso não quer dizer que terá um efeito decisivo sobre o processo eleitoral do ano que vem. Afinal, em primeiro lugar, é preciso lembrar o obvio: Marina não traz para a chapa de Campos partidos, tempo de TV ou palanques regionais relevantes. Não há vereadores, prefeitos, governadores, deputados, senadores ou um número significativo de candidatos com viabilidade eleitoral acompanhando a adesão de Marina, pelo menos por enquanto. Ela carrega consigo seu carisma, seu recall e alguns quadros de sua Rede. E além de não carregar nenhum partido para a chapa de Campos, a ex-Ministra do Meio-Ambiente vai encontrar também um partido de porte médio, que não se caracteriza exatamente enquanto um grande “partido nacional”.

Partidos nacionais no Brasil, por sinal, são poucos: PT, PSDB, PMDB e mais alguns. O PSB – apesar de sua relevância – não está nessa lista. Tem força no Nordeste, pouca representatividade no sul do país, é frágil no Centro-Oeste e acaba de perder quadros importantes no sudeste. E Marina, cumpre lembrar, não logrou organizar uma estrutura que sequer viabilizasse a coleta de assinaturas para a formação de sua Rede.

Desde as eleições de 1994 as movimentações dos “partidos nacionais” tem sido decisivas para o desfecho das eleições presidenciais no Brasil. Aliás, chega ser cômico ver a ingenuidade de alguns articulistas da grande mídia incomodados com a “polarização” entre PT e PSDB. Ora, trata-se, simplesmente, do embate político entre os dois partidos que efetivamente reuniram – até então – condições reais de disputa num país continental, consolidando-se enquanto polos divergentes em torno dos grandes temas nacionais. Não se trata de uma invenção maquiavélica do PT ou um desejo do PSDB.

O fato é que, caso nenhum partido nacional venha a aderir ao consórcio Campos-Marina, a dupla estará diante do risco real de protagonizar um fiasco em 2014. E as movimentações dos partidos mais importantes como PDT, PTB, PC do B, PR e PP, indicam que, pela responsabilidade e a identificação com o atual projeto político, representado por Lula e Dilma, devem seguir no atual bloco governista. E o PPS de Roberto Freire parece ter saído bastante magoado das negociações com Marina.

Portanto, por enquanto, faltam a Marina e Eduardo estrutura partidária, base de apoio com palanques regionais fortes e tempo de TV para se tornarem competitivos. E, goste-se ou não, eleições no Brasil se decidem, em grande medida, pelo somatório desses elementos.

Além disso, cumpre registrar que a “cultura do voto” no Brasil é essencialmente presidencialista. Ninguém vota para Vice-Presidente. A transferência de votos de Marina para Eduardo, evidentemente, não é automática. O mais provável é que, num primeiro momento, seus votos se dividam entre Dilma, Campos e Aécio. Mas haveria ainda outra hipótese, qual seja, a desistência de Eduardo Campos em favor de Marina. Nesse caso, o Governador de Pernambuco correria o risco de explodir o PSB. E, além disso, é cedo para avaliar os efeitos da movimentação de Marina sobre sua própria imagem. O certo é que, no mínimo, ela arranhou seu principal capital político, que era sua condição de “outsider” da política.

Deve-se respeitar a decisão de Marina, mas a opção pelo PSB se deu nos marcos da “política tradicional” e seus seguidores mais identificados com a dinâmica das redes certamente chegarão a essa conclusão. E não se trata de fazer qualquer julgamento moral. Essa é apenas uma constatação. Falar em “nova política” se referindo à decisão de Marina é, no mínimo, um alheamento profundo em relação à realidade. Por diversos motivos, Marina se viu diante do imperativo de “jogar o jogo”. E assim o fez.

Por outro lado, o reingresso de Marina no cenário eleitoral, com apoio de Campos, poderia forçar uma inflexão nos debates sobre o país e um amplo conjunto de questões poderiam levar Dilma e Aécio a uma mudança de postura. Seguramente, Marina – e não Campos – é quem reúne melhores condições de encarnar o desejo de mudança nas estruturas de representação política manifesto pelos protestos de junho no Brasil.

Neste cenário – Marina encabeçando a chapa do PSB – as dificuldades estruturais descritas acima permaneceriam, mas, certamente, a capacidade de enfrentá-las seria outra. De qualquer forma, esses seriam alguns dos desafios imediatos colocados diante da aliança Campos-Marina. A forma como a dupla os enfrentará é o que vai definir qual o efeito concreto dessa união sobre a sucessão presidencial de 2014.

Por fim, vale a advertência de que boa parte das análises que temos visto desde sábado oscilam entre especulação e torcida. A ideia do fim da polarização entre PT e PSDB, por exemplo, ainda é uma possibilidade, mas não há nenhuma garantia de que venha mesmo ocorrer. Campos e Marina deram um passo – inteligente e arrojado – para consolidarem uma alternativa aos dois polos da política nacional. Mas foi apenas o primeiro passo e os demais não dependem apenas de suas vontades e habilidade política. PT e PSDB podem seguir polarizando a política nacional. Quem viver verá.

(*) Secretário-Geral do Governo do Estado do Rio Grande do Sul e coordenador do Gabinete Digital

Publicado em Carta Maior