Há dois anos, Serra foi derrotado novamente por Lula, desta vez pelo motivo contrário ao de 2002: Serra era candidato de oposição a um governo bem avaliado. Lula chegou ao final de seu mandato com 80% na soma de “ótimo” e “bom” e isso permitiu que elegesse sua sucessora. Agora, na eleição paulistana, Serra é o candidato de um governo que tem somente 20% na avaliação de “ótimo” e “bom”. Com esse nível de avaliação, Kassab dificilmente se reelegeria. O que dizer, então, de eleger seu sucessor?

Uma das coisas mais previsíveis em eleições é que governos bem avaliados saem vitoriosos e governos mal avaliados são derrotados. Essa afirmação causa irritação de tão simples que é, mas é impressionante como a maioria das pessoas a esquece quando analisam cenários eleitorais. Em 1994, o governo Itamar Franco estava bem avaliado e seu ex-ministro da Fazenda, Fernando Henrique, foi eleito. Em 1998, o próprio Fernando Henrique estava bem avaliado, e foi reeleito. Em 2006, Lula tinha 56% de “ótimo” e “bom” no mês da eleição. Estava bem avaliado, e venceu. Há quatro anos, às vésperas da eleição municipal, Kassab tinha em torno de 60% de “ótimo” e “bom”. Não por acaso, foi reeleito.

O eleitor não é esquizofrênico. Se um governante está indo bem, ele o mantém no poder. Se a situação está ruim, tira o governo e coloca no lugar quem fez a campanha de oposição. As eleições podem ser divididas em dois grandes tipos: de mudança e de continuidade. Na São Paulo de 2012 está configurada uma eleição de mudança, porque a soma de “ótimo” e “bom” de Kassab é muito pequena. Como Serra é o candidato de Kassab, ele tende a ser derrotado. A pesquisa publicada na semana passada pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, mostrando empate técnico entre Serra e Russomano, nada mais é do que o reflexo dessa avaliação de Kassab.

Na eleição de 2008, analisamos os dados de 76 municípios em que os prefeitos disputavam a reeleição. Descobrimos uma forte relação estatística (não linear) entre avaliação de governo e vitória eleitoral. Quando um prefeito tem 25% de “ótimo” e “bom”, tem no máximo 10% de chances de ser reeleito. Trata-se de uma análise estatística, mas, na prática, não temos um só caso no qual um prefeito com 25% ou menos de “ótimo” e “bom” tenha saído vitorioso. Um prefeito com 40% de “ótimo” e “bom” também dificilmente é reeleito. As chances de que isso ocorra não passam de 30%. A zona de conforto para se ganhar uma reeleição é de 55% de “ótimo” e “bom”, para cima. São raros os derrotados. Em geral, perdem para si próprios porque cometem alguma barbeiragem durante a campanha.

Reeleger-se é mais fácil do que eleger o sucessor. A situação de reeleição é uma situação plebiscitária. Mantém-se o que vai bem e muda-se o que vai mal. Quando, porém, um prefeito tenta eleger o sucessor, que é o caso da dupla Kassab e Serra, a tarefa é muito mais difícil. Na eleição de 2010, Serra e seus seguidores desprezaram isso e defenderam a visão de que o eleitorado iria comparar um Serra competente e bem preparado com uma Dilma inexperiente. Obviamente, isso teve muito menos peso do que a avaliação do governo Lula.

Para que Serra deixe de ser o favorito para a derrota é preciso que a campanha do PT não o associe ao governo Kassab. Isso seria um erro do ponto de vista do PT. Ou, então, que a avaliação do governo Kassab melhorasse muito durante a eleição, graças à propaganda eleitoral de Serra. Em 2008, a avaliação de Kassab melhorou durante a campanha, saindo de 40% de “ótimo” e “bom” para 60% perto do dia da eleição. Se agora melhorar dos atuais 20% para 40% de “ótimo” e “bom”, ainda assim pode não ser suficiente para que Serra colha os dividendos eleitorais necessários para a vitória. É muito difícil eleger o sucessor com somente 40% de “ótimo” e “bom”. Aliás, é difícil até mesmo se reeleger.

O resultado da pesquisa que coloca Serra e Russomano em empate técnico nada mais é do que produto da avaliação da prefeitura de Kassab. O eleitor de São Paulo está em busca de alguém que represente mudança. É por isso que o outro lado da moeda das dificuldades de Serra é o eventual favoritismo de Haddad. Para quem duvidar disso, basta ver que, nas últimas seis eleições para prefeito em São Paulo, o candidato do PT ou foi o segundo mais votado ou venceu. Se essa regularidade se repetir, Haddad tem vaga garantida no segundo turno. Não serei eu a afirmar que esta eleição será a primeira na história de São Paulo na qual o PT ficará da terceira posição para baixo. Deixo isso para aqueles que se consideram gênios e que, por isso, podem ignorar as regularidades. Se Haddad for para o segundo turno com Serra, a mudança em relação a Kassab será representada por Haddad.

*Alberto Carlos Almeida é sociólogo e professor universitário, é autor de “A Cabeça do Brasileiro” e “O Dedo na Ferida: Menos Imposto, Mais Consumo”.