1. A informação, encontrei-a ao princípio do fim-de-semana no SIC Notícias. Acredito que também a teria encontrado no canal aberto da SIC e mesmo nos restantes canais não pagos, aconteceu decerto que simplesmente não calhou. De resto, o SIC Notícias não é propriamente um sítio recôndito, não é lugar para guardar segredos, apenas acontece que não é canal frequentado pela maioria que prefere os canais ditos gratuitos que por sinal não são tão gratuitos quanto parecem.

Mas era uma informação importante, isso sim, tanto e de tal modo que, mal a vi, logo pensei que faria manchete de primeira página em mais de um jornal diário do dia seguinte, convicção que não tive oportunidade de confirmar mas me parece altamente provável. E, afinal, de que se tratava? Falava-se da crise, naturalmente, dos seus impactos e consequências, das sacrossantas agências de rating por vezes muito desdenhadas mas de fato sempre reverenciadas pelos mídia e não só, e também do que pode ser designado como sendo a mais recente novidade no quadro deste assunto: as grandes manifestações populares de protesto e indignação que inicialmente pareciam ser uma especificidade europeia, iniciadas na Grécia, havidas em França, na Itália e no Reino Unido (aí talvez com um perfil talvez um pouco diferente que nunca ficou limpidamente desenhado), ganhando Madrid (como que estimuladas pela visita de Bento XVI, o que de qualquer modo nunca decerto será contabilizado como milagre seu quando chegar a hora da beatificação), acontecidas também em Portugal, como bem se sabe, ainda que num tom relativamente soft que não lhes reduz significado nem é sintoma de menor convicção. Até que, um dia, chegaram notícias de fora da Europa. Primeiro de Israel, país onde a comunicação social nos fizera crer que só se pensaria em novos colonatos e preocupações afins. Depois nos Estados Unidos, onde até há pouco tempo só os avanços do Tea Party eram notícia.

2. Era, pois, verdade: nos Estados Unidos da América há mais vida para lá da senhora Sarah Palin e daquele governador sulista que coleciona execuções capitais, das falências estrondosas mas principescamente remuneradas e da clamorosa investidura de um Nobel da Paz nas pouco honrosas funções de líder formal do mais agressor país do mundo. Nos Estados Unidos da América há milhares de cidadãos indignados que enchem ruas e praças para protestarem não apenas contra as guerras aliás fracassadas em que o seu país se envolveu, o que quase se diria que fazem apenas de passagem, mas também e sobretudo contra o modelo sociopolítico que lhes impõe o desamparo perante a doença, a incerteza laboral no presente e a provável miséria no futuro, o constante aprofundamento da distância abissal entre multibilionários e sobreexplorados, a fome que emerge em vários lugares do país e que só pontualmente é mitigada pelas humilhantes distribuições de alimentos organizadas por organizações caritativas. Nos Estados Unidos da América, o suposto paraíso do capitalismo, há, enfim, milhares de cidadãos que acusam o capitalismo pelos crimes que são a sua inevitável forma de existir, e que não o fazem usando indiretas fórmulas prudentes mas sim chamando o monstro pelo seu nome e com as letras todas. Pelos vistos, sem medo que os apodem de comunistas, acusação que nos Estados Unidos costuma desencadear perseguições verdadeiramente temíveis.

3. Foi, como bem se compreende, um conjunto de informações não muito extenso mas de excepcionalíssima importância para a abertura de eventuais perspectivas sobre os caminhos que a História pode vir a tomar não já apenas na Europa e no chamado Terceiro Mundo pauperizado mas também na mítica Caverna de Ali-Babá capitalista. E entre as informações chegou um número: o desemprego nos Estados Unidos (e desemprego sem apoios sociais como os que embora dificilmente ainda resistem na «velha Europa») é estimado pelos técnicos numa taxa superior a 16% que resulta da soma do número oficial com o número do desemprego factual mas excluído das estatísticas estatais. Acontecendo ainda que a tendência não é para a sua redução, antes pelo contrário. Não sei se é a isto que, usando uma metáfora frequente, se pode chamar «bomba de relógio» social de que se ouça o tictac anunciador. Mas não é preciso apurar muito o ouvido para admitirmos que talvez alguma coisa se mova. Um dia se saberá se é assim. E em que sentido.

Fonte: O Diário.info (Portugal)