Caros artistas brasileiros:

A tensão criada pelo somatório de desacertos na área das artes, sentida praticamente em todos os níveis, está provocando uma reação, saudável por um lado, por outro, desordenada. Poucos artistas ou grupos heterogêneos se articulam, tentando decifrar as intrincadas arapucas urdidas pelo atávico oportunismo existente no sistema de defesa de nossos direitos e controle do mercado de trabalho.

A deformação estrutural na conduta interna das instituições responsáveis pela defesa desses mecanismos as torna anacrônicas, travando o desenvolvimento, a criatividade e a sobrevivência da maioria de nossos artistas.

Nossa arte hoje está perdida em um labirinto, sem recursos para a produção das obras recusadas pelo sistema, que privilegia o “panelismo”, com raríssimas exceções. Presa fácil dos meios de comunicação e comercialização, ficou imersa em um oceano profundo de desacertos, e seu destino entregue aos predadores de plantão, principalmente os que manipulam nossos direitos. Isto não é mais novidade para ninguém.

Se em todas as áreas da arte brasileira fomos capazes de impressionar com nossa criatividade, a ponto de sermos imitados lá fora, por que não teríamos moral de reivindicarmos nossos direitos em nossa própria casa? Dada a pluralidade de conceituações estéticas em um país como o nosso, é natural e sadia a discussão e os desentendimentos, gerando uma desagregação e rachas entre as tendências. Mas esta não é a questão a ser considerada no momento. Que isto fique inteiramente à parte do assunto em pauta.

O que importa, por agora, é o outro lado da moeda: uma GRITA a ser ouvida na junção de nosso elo unificante, com todos os profissionais, sem distinção de castas, filosofias ou facções, em uma mesma arca, em busca de salvação, ante esse dilúvio de nossos direitos. Precisamos arrumar a casa, primeiro, remover os entulhos, varrer a poeira para podermos receber a visita de um novo tempo.

Já que estamos com a boca no trombone, em plena CPI no Congresso, comecemos pela música. O nosso objetivo básico é a reparação dos males causados pelas irregularidades dos meios adotados pelo Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), carente de transparência na arrecadação e distribuição dos direitos autorais e com sérios problemas estruturais.

Na ausência da Ordem dos Músicos do Brasil (OMB), com poderes legais para promover objetivamente as transformações da atual realidade da classe, os arautos heroicos do Grupo de Ação Parlamentar (GAP) e outros grupos pleiteiam, junto ao governo, a fiscalização daquele órgão, que hoje está à mercê do descrédito histórico que o Estado conquistou.

Pudemos votar e escolher nossos dirigentes políticos e é de se supor que estejam dispostos a endossar os reclamos de nossa GRITA. Mas, se não nos juntamos e lhes oferecemos concretamente as questões a serem superadas, ficando à espera que as adivinhem, desviados pela via das distorções propostas por nossos algozes que percorrem os corredores dos palácios, então a quem recorrer?

No Planalto, os grupos conscientes e bem intencionados, ao discutirem claramente nossos propósitos, de forma convincente, encontram na plateia colegas com posições contrárias, deixando claro um racha sem cabimento, dentro da própria classe, comprovando a nossa atomização. Cômico, se não fosse trágico.

Toda união pressupõe uma identificação geral em torno de um objetivo. Lutar por mudanças não leva à prisão, como há muitos anos. É só reassumir nossa fibra, despertar nossa criatividade coletiva e partir para a GRITA. Temos, entre nós e aliados nossos, juristas capacitados para elaborar as leis mais intrincadas do direito autoral; reengenharias capazes de reconstruir um método concreto e correto de arrecadação e distribuição; uma assembleia para discutirmos nossos propósitos, via internet, facilitando um diálogo nacional; e, basicamente, o poder e a força da clareza dos objetivos para a construção de um diálogo, tanto com o governo ou com quem quer que seja sobre nossas propostas.

Temos a OMB e os sindicatos das categorias, amorfos, por carência de nossas decisões, necessitando de reformas estruturais. Claro que, no momento preciso, recorreríamos ao Estado para um apoio logístico, dispensando a entrega do bastão.

Não estamos propondo um berro desesperado, mas uma GRITA consciente e democrática dos artistas de nossa música, para a reformulação dos conceitos atuais, buscando a força de nossa união para, com ela, removermos as pesadas pedras de nosso caminho.

Como ponto de partida, sugiro a todos que se manifestem, colaborando com sugestões sobre a estruturação deste projeto, tentando alcançar o maior número de adesões que justifiquem a razão de uma verdadeira representatividade.

Façamos uma experiência. Se estiverem de acordo respondam apenas sim e encaminhem esse recado ao maior número de colegas nossos.

De posse do resultado, dependendo da pirâmide de adesões conseguidas, partiríamos para uma organização, compondo uma mecânica votada pela maioria dos profissionais registrados no país, para mantermos essa chama acesa e, com ela decidirmos os passos de nosso destino, numa GRITA civilizada, democrática, sem vínculos partidários ou empresariais.

Não é tão complicado assim. Ou acreditamos e partimos para a ação, ou continuamos nos desintegrando, fartando a fome dos predadores.