A formação de uma nova classe média no Brasil se reflete num movimento inclusivo que estimula a estrutura industrial como um todo. O Brasil é um país em desenvolvimento, que precisa aumentar a participação da indústria no PIB como uma forma de incluir pessoas num mercado de trabalho mais dinâmico e de prover bens que esses cidadãos passam crescentemente a demandar.

A Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) – lançada em 2008 como um aprofundamento da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), que tinha foco no desenvolvimento de setores e tecnologias – encerra seu primeiro ciclo com 425 medidas estruturadas, das quais 99% estão operacionais. Esses indicadores estão longe de ser os melhores para avaliar a efetividade de uma política industrial, mas mostram o sucesso em romper com a inércia ideológica e burocrática para colocar em funcionamento uma estrutura de planejamento e execução ampla dentro do setor público e articulada com o setor privado.

Os resultados imediatos da PDP ficaram comprometidos pela crise internacional, cujos efeitos atingiram o Brasil a partir de setembro de 2008. A maioria de suas metas não será cumprida. Ainda assim, ressaltou-se um dos princípios da PDP: é preciso ter metas. Isso é parte do esforço de planejamento e de controle de uma política industrial, conferindo um norte para a atuação dos diversos atores. Não cumpri-las não significa necessariamente um insucesso, mas impõe novos esforços de avaliação e planejamento. Assim, a primeira lição aprendida pela PDP 2008-2010 foi que a política deve ter um norte, mas ser flexível e adaptável às circunstâncias.

Subsídios e instrumentos protecionistas não são inaceitáveis, mas devem ser usados com cuidado, segundo regras da OMC

Nesse sentido, a PDP foi decisiva como instrumento de identificação e negociação de medidas que fizeram parte do esforço contracíclico do governo federal, como é o caso do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), idealizado pelo Ministério da Fazenda e implantado pelo BNDES com equalização de taxa de juros realizada pelo Tesouro Nacional.

Esses resultados iniciais podem ser considerados alvissareiros, ainda que o tempo seja curto para o horizonte de uma política industrial. Essa é a segunda lição: uma política industrial deve ser um instrumento permanente, pois seus resultados mais significativos surgem a longo prazo.

A PDP busca ainda aprender com as experiências do passado, reconhecendo tanto a necessidade de intervenções pontuais e setoriais por parte do Estado quanto o papel sancionador do mercado. Não é uma política pronta, portanto, mas deve ter um caráter abrangente e evolucionista. É preciso partir da indústria existente e mirar o fortalecimento possível de cada setor, ao mesmo tempo em que se investe no desenvolvimento de tecnologias emergentes e de ampla difusão como forma de garantir a sustentabilidade do desenvolvimento industrial (terceira lição: é necessário que a política industrial tenha coerência com o sistema produtivo).

Por isso, a quarta lição é que a inovação é chave. A nova política industrial não parte de uma indústria nascente, em que a simples criação de capacidade produtiva significa uma mudança estrutural. O Brasil está num estágio industrial intermediário e tem como principal desafio dar um salto rumo à autonomia tecnológica. Isso significa que é preciso aumentar os dispêndios em pesquisa e desenvolvimento (P&D), em especial os de origem privada. Isso vale tanto para as empresas de capital nacional quanto para as transnacionais, que podem ampliar os esforços inovativos feitos no Brasil e, assim, fortalecer a capacidade competitiva nacional, enobrecer a cadeia produtiva e gerar melhores empregos.

Mas a inovação não é encarada com o voluntarismo de tentar internalizar no Brasil os setores mais inovadores de forma artificial, às custas de um protecionismo excessivo. A inovação tem caráter amplo e também está presente nos setores tradicionais. Trazer a inovação para o centro da política industrial significa não só apostar no desenvolvimento de tecnologias emergentes ou de alta transversalidade na estrutura produtiva, mas também apoiar a conquista de mercados, a internacionalização de empresas de capital nacional em busca do domínio de cadeias produtivas globais, incorporando e desenvolvendo as funções corporativas mais nobres, como o P&D, o marketing, a logística e as estratégias financeiras.

A PDP tem ainda como sua quinta lição a de que é preciso ampliar a presença externa das empresas brasileiras, tanto pelo aumento da participação nas exportações mundiais quanto via investimentos diretos externos das empresas de capital nacional. Além de garantir a sustentabilidade do balanço de pagamentos e do crescimento econômico, essa preocupação responde à necessidade de expor os objetivos da política industrial ao mercado: é preciso desenvolver competências e vantagens comparativas, mas buscando níveis globais de competitividade.

A política industrial brasileira renasce na vanguarda das melhores práticas mundiais. A PDP representa um esforço de retomar políticas de desenvolvimento industrial, reconhecendo que subsídios e instrumentos protecionistas não são por definição inaceitáveis, mas devem ser usados com parcimônia, segundo as regras da OMC, e orientados por metas de desempenho. Ela se caracteriza ainda por ser abrangente, evolucionista e por buscar se tornar uma política permanente, que propicie resultados de longo prazo. O passo é curto. A vista mira longe.

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João Carlos Ferraz é economista e diretor do BNDES

Marcelo Miterhof é economista e assessor da presidência do BNDES

Felipe Marques é economista e assessor da área de pesquisas econômicas do BNDES.

Fone: Valor Econômico