Entre 17 de abril de 2016 e 2 de agosto de 2017, passaram-se 472 dias. As duas datas registraram sessões da Câmara dos Deputados marcadas pela infâmia. Na primeira, o ex-deputado Eduardo Cunha, hoje condenado a 15 anos e quatro meses de prisão, acolheu um pedido de impeachment sem crime de responsabilidade contra a presidente legítima Dilma Rousseff. Na segunda, ao custo de R$ 13,4 bilhões, o ilegítimo Michel Temer foi salvo por esse mesmo Congresso, depois de ser flagrado nos grampos da JBS.

Entre os dois períodos, o Brasil viveu – e continua vivendo – o período mais triste de sua história. Com o assassinato da democracia pelos próprios parlamentares, milhões de empregos foram perdidos, a confiança dos brasileiros nas instituições foi ao nível mais baixo de todos os tempos e o Brasil é hoje governado por uma espécie de cleptocracia parlamentar, que executa uma agenda antipopular e contrária aos interesses nacionais.

No mundo, o Brasil, que antes era admirado, passou a provocar um misto de espanto e perplexidade. Lá fora, se perguntam: como vocês tiraram uma presidente honesta para colocar no poder um vice denunciado por corrupção? Como aceitaram abrir mão do papel de liderança regional, para se sujeitar ao papel de vassalos de um Império? Como engolem passivamente a destruição das empresas, dos sonhos e das esperanças de todo um povo?

Há quem diga que os brasileiros não saíram às ruas contra Michel Temer, aprovado por apenas 4% da população, porque sua queda colocaria no poder Rodrigo Maia – o que seria mais do mesmo. Ou porque, eventualmente, favoreceria a volta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por meio de eleições diretas antecipadas. Outros argumentam que não houve convocação popular.

O fato é que os brasileiros estão cansados. Os que acreditaram no conto da carochinha de que bastava tirar a presidente Dilma começam a se dar conta de que foram manipulados pelos setores mais sujos da classe política. Se antes a corrupção era um “mal necessário” para garantir a chamada governabilidade no chamado presidencialismo de coalizão, com Temer ela saiu da retaguarda do poder para subir ao palco principal. E o espetáculo é esse show de horrores que está aí.

Toda essa bagunça começou quando a direita se deu conta de que, após quatro derrotas presidenciais, logo viria a quinta, com a provável vitória do ex-presidente Lula em 2018. Ou seja: o chamado lulismo conseguiria levar adiante um projeto de vinte anos de poder – o que seria inaceitável para as forças derrotadas em 2014. A pretexto de destruir Lula, destruíram o próprio país.

Leonardo Attuch é jornalista e editor-responsável pelo 247, além de colunista das revistas Istoé e Nordeste

Publicado em Revista Nordeste.