O ato com intelectuais, artistas e juristas no Teatro da PUC-SP, o Tuca, foi marcado pela crítica ao desrespeito à mulher Dilma, o repúdio ao ódio que se espalha contra os eleitores de Dilma, e a crítica ao desgoverno tucano na área de abastecimento de água e energia. O evento que lotou os 800 lugares do teatro numa segunda-feira à noite, e ainda fechou a rua Monte Alegre com milhares de militantes que não puderam entrar, desde o fim de tarde, coroou a campanha de segundo turno com o clima de entusiasmo com as vésperas da eleição.
Na companhia do ex-presidente Lula e de aliados do próprio partido, como o prefeito paulistano Fernando Haddad e o ex-candidato ao governo paulista Alexandre Padilha; do ex-presidente do PSB, Roberto Amaral; do ex-candidato do Psol ao governo de São Paulo, Gilberto Maringoni; do vice-presidente da República, o peemedebista Michel Temer; do economista e fundador do PSDB Luiz Carlos Bresser-Pereira; de artistas, intelectuais e milhares de pessoas que lotaram o histórico teatro e a rua Monte Alegre, na zona oeste da capital, a candidata do PT, Dilma Rousseff, fez um discurso veemente, que inflamou e emocionou a militância. Participaram ainda do ato o presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, o presidente da Fundação Maurício Grabois, Adalberto Monteiro, o presidente estadual do PCdoB e deputado federal eleito Orlando Silva e a representante da UJS Carina Vitral.

Entre os artistas presentes estavam o diretor de teatro José Celso Martinez Corrêa, do Teatro Oficina, o escritor e jornalista Fernando Morais, o escritor Raduam Nassar e a compositora e deputada estadual reeleita Lecy Brandão (PCdoB-SP). Um vídeo com o depoimento do cantor e compositor Chico Buarque foi exibido durante o evento. Cantores de vários estilos não perderam a oportunidade de cantar seus poemas em homenagem ao momento histórico, desde o hip-hop, até os ritmos mais tradicionais do nordeste.

O ato político foi tomado pela euforia com o anúncio, pelos microfones, pouco depois das 20 horas, de que pesquisas recém-divulgadas dão vantagem à candidata à reeleição, por 52% a 48%.
Governo do volume morto
A presidenta Dilma Rousseff comparou os projetos políticos que disputam o segundo turno das eleições presidenciais, ao mostrar como os tucanos tratam o abastecimento de energia no Governo FHC e o abastecimento de água no Governo Alckmin. Dilma destacou que São Paulo está sofrendo as consequências da falta de planejamento e de investimentos antecipados, algo que o Brasil viveu nos anos de governo do PSDB, com racionamentos de energia elétrica.
“Água é atribuição constitucional de Estados e Municípios. A energia elétrica é atribuição constitucional da União. Quando eles (PSDB) foram governo, deixaram esse país às escuras, porque fizeram uma privatização maluca, olharam o país e não viram os interesses da população, mas os interesses de alguns poucos grupos econômicos. No caso da água, esta é a crônica de uma morte anunciada. Ninguém da imprensa hoje pode ficar surpreso pelo fato de estar faltando água em São Paulo”, disse.
Segundo Dilma, a grave crise de abastecimento de água se deve à “incapacidade de gestão absolutamente às claras de um grupo político que pretende dirigir o país”.


Brasil pequeno dos tucanos
Ela ainda afirmou que o projeto adversário representa a política que quer manter o Brasil submisso a países desenvolvidos. “Não podemos deixar que volte o tipo de política que olha para o País de forma irresponsável”, disse ao receber o manifesto de apoio de várias categorias intelectuais e artísticas.
Em seu discurso, a presidenta afirmou que os brasileiros são responsáveis por manter o Brasil no rumo certo. “Eles pensam o Brasil pequeno, sempre pensaram. Eles fazem a velha política de se atrelar aos grandes países. Querem entregar o Brasil. Querem voltar com a Alca, não querem os Brics e são capazes de menosprezar o Mercosul”, apontou Dilma Rousseff.
A presidenta afirmou também que a maneira “irresponsável” com que os governos tucanos governam se reflete também na política de emprego. Dilma explicou que o projeto adversário “planta inflação para colher juros” e põe em risco a geração de emprego. “Eles inventaram o termo ‘empregabilidade’, para justificar os milhões que não conseguiam emprego. “(Para eles) Tem gente que tem empregabilidade, tem gente que não tem. É o maior álibi para uma política de destruição do emprego neste país.” Em 2002, eram 11,5 milhões de desempregados. O Brasil só perdia para a Índia em número de desempregados no mundo”.
A candidata petista também criticou a “manipulação absolutamente irresponsável que fazem com o mercado de ações”. Desde agosto, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) tem oscilado ao sabor dos números das pesquisas eleitorais e dos fatos que marcam a eleição. Naquele mês, em que, no dia 13, morreu o então candidato do PSB Eduardo Campos, a Bovespa teve forte valorização de 9,78%.


Lula, Dilma e o preconceito
Coube ao ex-presidente Lula falar da indignação pelo que chamou de “desrespeito” de Aécio Neves contra a presidenta na campanha e em debates na televisão. O ex-presidente Lula demonstrou indignação com a maneira como o tucano e seus aliados “tratam uma mulher”.
“Eu achava que eu era o cara que mais apanhava no mundo. Eu achava que o ódio era comigo. Eu jamais teria a coragem, a petulância de chamá-la de leviana ou mentirosa, por mais que eu discordasse dela. Essas coisas a gente não aprende na universidade, a gente aprende de berço”, disse Lula. “Esse rapaz deve ter um problema que eu não vou explicar qual é porque não sei. Deve ter gente que pode explicar”, acrescentou, sobre Aécio. “Não é possível que esse rapaz não tenha tido educação e berço. Ele foi incapaz de respeitar uma senhora, uma mãe, uma avó”, asseverou Lula.
O ex-presidente também questionou se Aécio teria se comportado da mesma forma, se estivesse em disputa com um homem, ao invés de uma mulher. “Tem gente que só sabe ser durão contra mulher. Nós nunca dirigimos a eles metade das grosserias que eles usam”, afirmou. E completou: “A resposta que a gente vai dar a eles é a vitória de Dilma”.

Lula lembrou que o ódio ao PT é um dos elementos marcantes do processo eleitoral deste ano. “Eu nunca vi o ódio disseminado contra um partido político como o que eu vejo contra o PT. Um negócio que eu não via mesmo no tempo do regime militar. Não poderia imaginar que o neto do doutor Tancredo Neves fosse utilizar tanto ódio contra o PT. Porque ele (Aécio) fala que quer acabar com o PT, tirar o PT do governo. Eles não vão tirar porque o povo é mais sábio do que as pessoas imaginam. Houve um tempo em que a Globo falava e as pessoas achavam que era verdade. Isso acabou.”
Dilma também falou do tom agressivo da campanha e atribuiu essa situação à tentativa sistemática dos tucanos de pregarem inverdades a respeito de seu governo. “Nós enfrentamos uma guerra da comunicação contra aquilo que é a verdade dos fatos”, pontuou a presidenta.
Segundo Dilma Rousseff, em 2014 “o confronto começou bem antes, num processo que misturava desinformação e a meia verdade” e se manifestou nos meses que antecederam a Copa do Mundo. “O nível de desqualificação do Brasil pela imprensa foi estarrecedor. O Lula falava ‘nunca antes na história deste país’. Eu uso estarrecedor, porque meu caso é de estarrecimento”, brincou, usando a palavra que tem marcado sua participação nos debates.
Ódio à esquerda
O prefeito Fernando Haddad engrossou o coro de indignação contra os ataques tucanos a Dilma. Segundo ele, os tucanos não dizem, mas têm dificuldade em compreender a força da mulher brasileira, a força de Dilma. “Como eles te subestimaram! Não sabiam com quem estavam lidando! Imaginavam que a senhora se elegeu pela força do Lula e que se batessem duro, como fazem todo santo dia, ela não vai aguentar. Ela vai bambear. Pois mexeram com a pessoa errada. Não acreditaram na sua trajetória de vida e na sua força e que por uma segunda vez a senhora ia suportar a tortura e vencê-los mais uma vez”.
A ex-prefeita Marta Suplicy chamou a atenção para a importância dos próximos dias na luta pelos votos. “Estamos talvez no momento mais decisivo do nosso partido e talvez mais decisivo do nosso país.” Ela destacou como “ fantástico” o legado do Governo Dilma na cultura. Citou a estruturação e consolidação de políticas de estado de cultura, como o Sistema Nacional de Cultura, que repassa o recurso para a cultura sem passar o pires na mão, assim como ocorre hoje com o SUS; o Vale Cultura, hoje na mão de 300 mil trabalhadores; a PEC da música, o Marco Civil da Internet. “Com o CEU das artes, que muito pouca gente sabe que estão sendo construídos, começa um momento interessante também para a cultura”, afirmou a ministra.
A disputa eleitoral tem sido marcada por agressões sistemáticas, morais e até físicas, de simpatizantes do candidato tucano contra militantes petistas e pessoas que usam símbolos do partido. Em 15 de junho, na abertura da Copa do Mundo, a presidenta da República foi vaiada e xingada na abertura da Copa do Mundo, na Arena Corinthians (Itaquerão), em São Paulo.
No palco do Tuca, a escritora e artista plástica Raquel Trindade fez discurso emocionado, no qual clamou pelo Estado laico, pela diversidade cultural e direito de culto. Ela contou que viveu um momento difícil quando da ascensão da ex-candidata Marina Silva (PSB) nas pesquisas. “Entraram no meu quintal e quebraram os assentos dos meus orixás. Todas as religiões têm de ser respeitadas. Nós vivemos num país laico”, declarou.


Debut de Dilma no Tuca
O ato político no teatro da PUC de São Paulo ocorreu em um lugar emblemático. A universidade foi palco do dramático episódio da invasão pelas forças policiais comandadas pelo coronel Antonio Erasmo Dias, então secretário de Segurança Pública do estado de São Paulo, no governo de Paulo Egídio Martins, em 22 de setembro de 1977. O teatro também sofreu incêndios criminosos tendo que ser reconstruído, por ser palco preferencial de manifestações de esquerda.
Lula disse ter muito orgulho de estar naquele lugar, em que Dilma falaria pela primeira vez. Ele diz que sempre defendeu a importância do segundo turno para a politização do eleitor. “Se não fosse o segundo turno, não teríamos um momento como esse”, disse ele, sobre os atos com artistas e intelectuais que abrilhantam o fim da eleição, a cada campanha.
Foram inúmeras e emocionadas as manifestações de apoio de personalidades dos mais diversos espectros da sociedade.
O jurista Celso Antonio Bandeira de Mello falou da inconsistência, a seu ver, da candidatura de Aécio . “Entre os dois candidatos, um deles é quase uma folha em branco, que não tem história pessoal.”
O ex-candidato do Psol ao governo paulista, Gilberto Maringoni, discursou pelo apoio à candidatura petista ao Palácio do Planalto. “Tenho críticas ao governo, mas vou deixar para depois. Agora vamos falar do que nos une, especialmente porque do lado de lá está Aécio Neves, o neoliberalismo heavy metal. É uma escolha entre a democracia e o abismo”, disse Maringoni.
Representante da luta pelas minorias no Congresso Nacional, o deputado do Psol Jean Wyllys reafirmou seu apoio à candidata. Ele disse que Dilma representa um melhor projeto por proporcionar avanços na sociedade brasileira, mantendo sempre o diálogo com as minorias, ao contrário do PSDB.
“Eu tenho memória e lembro que era o único que pegava ônibus e não tinha negros na minha faculdade. Hoje há a negros, há mulheres, há gente da periferia”, justificou Wyllys.
Para o secretário de juventude do Movimento Sem Terra (MST), Raul Amorim, o importante é investir no diálogo com os eleitores indecisos. “É momento de chegar no vizinho, no amigo ou naquele que está indeciso e conversar sobre o projeto que está em jogo neste país”, disse ele.
O músico e bailarino pernambucano Antonio Nóbrega, disse que se viu “na contingência do que dizer para fortalecer revitalizar e ampliar o ânimo que ainda necessitamos para prosseguir na campanha marcada pelo espírito trágico da violência. Sobretudo da violência verbal”. Para ele, nessa campanha, as palavras foram continuamente desrespeitados e desonradas. “Temos que encontrar uma maneira nova de confrontar a violência alheia. Temos de descobrir um modo de pular desse velho dente por dente, olho por olho que estamos acostumados a ver no jogo politico. Em algum momento alguém terá que quebrar esse circulo vicioso”, apostou, cantando em seguida um poema de Ariano Suassuna musicado por ele, chamado “O rei e o palhaço”.
O ex-presidente do PSB de Marina Silva, Roberto Amaral, foi recebido com gritos de “Arraes presente é Dilma presidente”, ao que respondeu que “Arraes está presente aqui, mas está ausente no meu partido”, referindo-se ao apoio que os socialistas estão penhorando à candidatura conservadora de Aécio Neves à revelia de grande parte de sua militância.
“Não mudamos de campo. Estamos onde sempre estivemos: ao lado dos trabalhadores, dos pobres, de Dilma. Ninguém pode contraditar a sua biografia”, disse ele, acrescentando que traz consigo o apoio do movimento sindical do PSB, da Juventude do PSB, do diretório da Bahia, da Paraíba, do Amapá, de Roraima, do presidente do PSB do Rio de Janeiro “e a quase totalidade do meu partido no Rio de Janeiro”.