Em entrevista ao jornalista Rodrigo Manzano, do ‘Meio & Mensagem’ – maior veículo especializado em comunicação no país –, a ministra-chefe da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Helena Chagas, defendeu a regulamentação da mídia brasileira. “A Constituição prevê que a mídia seja regulamentada, esse debate é inexorável e deve acompanhar a evolução tecnológica”, afirmou.

A ministra admitiu as dificuldades em pautar esse debate porque ele “começou um pouco enviesado, por conta do acirramento político, em um ano eleitoral”. Por isso, ele teria se tornado “uma espécie de clichê, uma expressão maldita”, mas é necessário “retirar o estigma” que cerca o tema. A jornalista refere-se ao debate deflagrado em 2010 pelo anúncio – feito por seu antecessor, Franklin Martins – de que o governo pretendia propor  um marco legal para o funcionamento dos meios de comunicação.

Na época, Franklin anunciou ter concluído um anteprojeto de lei disciplinando o tema, cujo conteúdo ele jamais divulgou por entender que caberia ao governo então já eleito dar ao assunto o tratamento que lhe parecesse mais adequado. O fato levou veículos da comunicação e políticos oposicionistas a acusarem o PT e o governo de pretenderem na verdade amordaçar a imprensa. Acusação semelhante havia sido feita, anos antes, quando o então porta-voz de Lula, Ricardo Kotscho, encampou uma antiga reivindicação dos sindicatos dos jornalistas de criar um Conselho Federal de Jornalismo, com competência inclusive para analisar o comportamento ético de profissionais e empresas da área.

Durante o atual governo, as críticas mudaram de lado. Militantes do PT e de outros partidos de esquerda, além de vários estudiosos da comunicação, passaram a questionar Dilma por não levar adiante a proposta de Franklin Martins – entregue ao ministro das Comunicações, Paulo Bernardo – e de ser muito generosa no repasse de verbas de publicidade para os grandes veículos, em especial a TV Globo.

Sem controle de conteúdo

Na entrevista à Meio & Mensagem, Helena Chagas trata dos dois assuntos. No primeiro caso, afirmou:

“A imprensa é livre, não há controle de conteúdo, a própria Constituição proíbe isso. Mas precisamos regular os meios de comunicação, até por uma necessidade de acompanhar as mudanças que o tempo trouxe. (…) ‘Controle social da mídia’ virou uma espécie de clichê, uma expressão maldita. Tem gente que ouve e sai correndo. Não se pode ter controle de conteúdo. Isso não existe. Mas temos de regulamentar e elaborar uma legislação de proteção ao cidadão que se sentir atingido na sua honra e dignidade por acusações da mídia. Essa discussão mistura tudo na mesma panela e estigmatiza o tema. É preciso tirar o estigma e discutir de maneira serena, tranquila, com o tempo que demandar”.

No segundo caso, ela declarou: “Todos acham que estão recebendo aquém do que mereceriam e é normal que o governo ouça muita reclamação e que haja pressões de todos os lados e tipos”. Segundo a ministra, a distribuição de publicidade leva em conta, de um lado, “um critério correto, baseado audiência, na mídia técnica”. Do outro, o desejo de regionalizar os investimentos “porque respeitamos o brasileiro, o cidadão que não mora nos grandes centros e não tem acesso às maiores redes e veículos”.

O maior anunciante do Brasil

Foi a regionalização, conforme as explicações da ministra, que provocou nos últimos anos um extraordinário aumento do número de veículos contemplados com propaganda federal. Em 2000, eles não passavam de 500. Hoje, há mais de 8 mil veículos cadastrados na Secom.

Com uma verba de publicidade que alcançou no ano passado R$ 1,79 bilhão, segundo dados do Instituto de Acompanhamento da Publicidade (IAP) citados pela revista, o governo federal é atualmente o maior anunciante do país.

Os números apontam que a tendência de diversificação dos meios que recebem verba, iniciada ainda no governo Lula, permaneceu na gestão de Chagas. Jornais e rádios regionais têm tido maior acesso aos recursos.

Entretanto, a ministra segue pressionada por setores da mídia brasileira e partidos políticos, sobretudo o PT, a ampliar a pulverização da verba publicitária federal. A análise é que a concentração ainda é grande e favorece a manutenção de oligopólios midiáticos.

Para Helena Chagas, “regionalização” não deve ser vista como sinônimo de “pulverização”, e sim de “democratização do acesso às mensagens do governo, à comunicação”. Ela acrescentou que tem sido bastante procurada por representantes da “mídia alternativa na internet, que reivindicam alguma forma do governo estimular o crescimento deles”. No entanto, a ministra  acredita que a solução para tais segmentos não terá que “necessariamente sair da verba publicitária, investimento que aplicamos com o objetivo de obter resultados, não uma doação”. Mas, sim, de possíveis “incentivos, como o financiamento do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social].

A ministra contou ter preparado um estudo sobre políticas de incentivo a pequenos veículos ao redor do mundo para que se pense na possibilidade de que seja adotado algo similar no Brasil.

João Santana e TV Brasil

Na entrevista, Helena Chagas falou ainda sobre um personagem que raramente aparece em manifestações oficiais de autoridades do governo, o marqueteiro João Santana:

“O João Santana é o marqueteiro do PT, foi responsável pela campanha da reeleição do presidente Lula, pela campanha da presidente Dilma. E será, muito provavelmente, responsável pelas próximas campanhas, além de ter uma relação muito boa conosco no governo, com a presidente Dilma. Temos um diálogo permanente”. 

Ela enfatizou que Santana “não tem nenhum contrato com o governo”.

A ministra disse ainda que a TV Brasil, ora sob a tutela da Secom, “está engatinhando” e poderá ganhar mais autonomia no futuro, de maneira a agilizar seus mecanismos de gestão, no momento limitados pela Lei 8.666, que rege as licitações públicas, e pelos procedimentos burocráticos impostos aos órgãos da administração direta. Questionada sobre a possibilidade de se cobrar impostos para financiar a emissora, a exemplo do que acontece com o canal público britânico BBC, Helena demonstrou cautela: “É uma questão que deve ser pensada com muita calma para que a gente não prejudique o trabalho que já foi feito”..

Leia abaixo parte da entrevista conforme publicado no site da Meio & Mensagem:

Maior anunciante do País, o governo federal investiu R$ 1,79 bilhão em publicidade em 2012, de acordo com os dados do Instituto de Acompanhamento da Publicidade (IAP). Os números apontam que a tendência de diversificação dos meios, com presença cada vez maior dos veículos regionais – sobretudo jornais e emissoras de rádio – permanece na gestão de Helena Chagas, ministra-chefe da Secretaria de Comunicação Social (Secom), em cujas atribuições estão incluídas a administração da verba institucional do governo e o alinhamento da comunicação de todos os ministérios e órgãos federais.
Em entrevista a Meio & Mensagem, a ministra afirmou que a decisão pela regionalização tem como objetivo fazer a comunicação do governo chegar “a todo cidadão brasileiro, more onde estiver, nas localidades mais remotas”. A proposta tem recebido crítica de setores da indústria, que afirmam a medida ser eleitoreira, análise refutada por Helena Chagas. “Alguns tratam como pulverização, mas nós tratamos como democratização do acesso às mensagens do governo, à comunicação”, explica. A Secom, atualmente, é pressionada tanto por setores de mídia, descrentes da eficiência da maior pulverização da verba, quanto da base do PT e da militância digital, que pleiteiam maior distribuição e menos concentração dos investimentos. A ministra afirma ter preparado um estudo de políticas de incentivo a pequenos veículos ao redor do mundo para que se pense na possibilidade de que seja adotado algo similar no Brasil. Para ela, a verba publicitária não deve ser entendida com essa finalidade.
Sobre o controle social e uma nova regulamentação para o setor, Helena Chagas diz que “a Constituição prevê que a mídia seja regulamentada, esse debate é inexorável e deve acompanhar a evolução tecnológica, mas começou um pouco enviesado, por conta do acirramento político, em um ano eleitoral”. Segundo a ministra, o controle social da mídia “virou uma espécie de clichê, uma expressão maldita” e que antes de discutir é preciso “retirar o estigma” que cerca o tema. Leia trechos da entrevista abaixo:

MEIO & MENSAGEM ›› Quando observamos o quadro de investimentos publicitários do governo federal na última década, percebe-se que o número de veículos aumenta. Qual é a função e o que a regionalização e descentralização representam, estrategicamente, para o governo?
HELENA CHAGAS ›› Demos continuidade a uma política muito bem-sucedida, criada pelo ministro Luiz Gushiken e seguida pelo ministro Franklin Martins, responsável por começar a regionalização que, ao lado do critério de mídia técnica, norteia a distribuição dos investimentos publicitários do governo federal. O critério da regionalização é muito importante e tem um fundamento claro: as mensagens do governo, sejam elas institucionais ou de utilidade pública, devem chegar a todo cidadão brasileiro, more onde estiver, nas localidades mais remotas. Ele tem o direito ao acesso dessa mensagem. Esta é a razão de ser da regionalização, que alguns tratam como pulverização, mas nós tratamos como democratização do acesso às mensagens do governo, à comunicação.
M&M ›› Qual é sua opinião sobre regulamentação dos meios de comunicação?
HELENA ›› A Constituição prevê que a mídia seja regulamentada, esse debate é inexorável e deve acompanhar a evolução tecnológica, mas começou um pouco enviesado, por conta do acirramento político, em um ano eleitoral. Começou errado e passou a haver uma interpretação de que qualquer regulamentação dos meios, qualquer iniciativa que versasse a esse respeito, seria controle de conteúdo. Não é. A imprensa é livre, não há controle de conteúdo, a própria Constituição ­proíbe isso. Mas precisamos regular os meios de comunicação, até por uma necessidade de acompanhar as mudanças que o tempo trouxe. Como vai ser esse mundo? 
M&M ›› Mas existe uma má vontade, de parte a parte, em discutir o controle social da mídia no Brasil.
HELENA ›› “Controle social da mídia” virou uma espécie de clichê, uma expressão maldita. Tem gente que ouve e sai correndo. Não se pode ter controle de conteúdo. Isso não existe. Mas temos de regulamentar e elaborar uma legislação de proteção ao cidadão que se sentir atingido na sua honra e dignidade por acusações da mídia. Essa discussão mistura tudo na mesma panela e estigmatiza o tema. É preciso tirar o estigma e discutir de maneira serena, tranquila, com o tempo que demandar.

A íntegra desta entrevista está publicada na edição 1560, de 20 de maio, exclusivamente para assinantes, disponível nas versões impressa e para tablets do Meio & Mensagem

Publicado em: http://www.meioemensagem.com.br/home/midia/noticias/2013/05/20/Secom-defende-debate-sobre-controle-social.html#ixzz2U9izJKss