“O Ipê que não queria ser Poste”

 

Um poste de luz, feito do tronco de uma árvore cortado nos matagais do estado de Rondônia (Brasil), localizado pelas coordenadas (Google Earth => 8047´24”S, 63052´44”W), ou seja; na Avenida Jatuarama, em Porto Velho, capital do estado de Rondônia, foi notícia durante o ano de 2010. E o motivo foi surpreendente: o poste foi colocado numa Avenida no ano de 1994.

 

Cheguei a pensar que a foto mostrada nos vários sites de informação pudesse ser uma montagem de computador, ou qualquer truque do gênero. Não é o que aconteceu com o poste florido! Na estação correta, em que os ipês florescem em Rondônia, fez surgir suas flores para calar quaisquer suspeitas de mágica ou enganação, tão comum na internet. O que quis dizer esta árvore ao seu algoz, aquele que a decepou, copa e galhos, sem o menor remorso e que a deixou tombada como se morta estivesse? E se foi, aparentemente transmutando a sua utilidade de viver para uma função secundária de um mero suporte de fios de cobre, numa rua qualquer de uma cidade pouco conhecida dos brasileiros do sudeste, centro oeste ou nordeste. Só sei dizer que a carga de energia era muito grande; a energia da vida, que fez com que as veias abertas se fechassem de novo. O movimento de sobe e desce da seiva rica persistiu. A ordem forte das raízes recém-criadas pela força da Natureza, para suportar o peso da tragédia, fez-se novamente. O reordenamento e o aprendizado da casca para realizar fotossíntese, foi  recriado. A reconexão dos eixos neurais da planta se reinventou adrede. O reaprendizado natural que o infortúnio ensina, aconteceu. A fisioterapia da suave reabilitação deu-se, em meio ao desassossego do ineditismo do evento. A redução do gasto de energia com a respiração, voltou a crescer. A árvore que havia hibernado por algum tempo com sabedoria imensa, disse presente. Tal qual o homem escravizado, que se submete ao duro trabalho, à nova ordem e às humilhações, sem jamais submeter-se completamente. Com o ipê foi do mesmo jeito! Acomodou-se, espertamente, para depois expressar com força máxima a sua arte! É muito comum vermos imagens do Homem derrotando a natureza, de desmatamentos, queimadas, poluição e outras agressões contra o meio ambiente. Porém, o ipê (a árvore símbolo do Brasil), é que foi protagonista nessa história. É a Natureza vencendo o Homem!

 

Como se sabe, hoje em dia, o computador também faz milagre a cada minuto. Como se fosse um ilusionista perfeito. Os hackers invadem bancos, ganham senhas, entram no Pentágono, descobrem segredos de Estado, criam cenários, modificam outros. Apagam memórias. Edward Joseph Snowden, o hacker, ex-analista da Inteligência do Governo Federal dos Estados Unidos, que denunciou a existência, em detalhes, do Sistema de Vigilância Global pela Agência de Segurança Nacional dos EUA, fez algo parecido. Sua denúncia, tornada pública, fez o mundo inteiro repensar sobre os direitos, independência e soberania dos povos de todos os países. Se um hacker consegue apagar memórias, a Natureza parece fazer acender outras. O ipê poderia ser ilusão gráfica; uma montagem:  -Mas não era!

 

Segundo o site “Estância Árvore da Vida”, a SEMA de Porto Velho (Secretaria do Meio Ambiente), solicitou algum tempo depois, a mudança da fiação elétrica para um poste de concreto que foi colocado ao lado, para poupar a árvore teimosa.

 

E, milagrosamente e com humilde bondade, o ipê deu flores ao Homem. Com uma mensagem filosófica vasta e profunda, ou mesmo religiosamente cristã – a de “dar a face direita a quem a esquerda esbofeteou”. Outra ainda – flores amarelas ao mundo. Ou quem sabe, o mesmo que registra a Bíblia – a vara de Arão que floresceu. Talvez seja necessário descalçarmos nossas sandálias, qual Jatrão, pois Nosso solo é sagrado!

 

 

 

 Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS. É natural de Cravinhos-SP. É Físico, poeta e contista. Tem textos publicados em 7 livros, sendo 4 “solos e entre eles, o Pequeno Dicionário de Caipirês e o livro infantil “A Sementinha” além de três outros publicados em antologias junto a outros escritores.