“[…] Relembrando a sua última passagem pela Fundação Calouste Gulbenkian no ano 2000, a convite do então presidente do Conselho de Administração Vítor Sá Machado, o economista norte-americano afirmou no dia 1 de dezembro, perante um auditório completamente lotado, que desde então “a situação só piorou”. “Espero que este momento não marque outro ciclo de 15 anos a piorar”, disse. Estava dado o mote para a sua intervenção (sempre pontuada com humor) que ao longo de 90 minutos se centrou sobretudo na realidade económica dos Estados Unidos, o país que melhor conhece e onde “experiência diariamente a desigualdade”, para fazer algumas extrapolações sobre a desigualdade ao nível global, e sobre a situação na Europa.

Nascido numa pequena cidade industrial no estado do Indiana, em plena “idade do ouro do capitalismo”, Joseph Stiglitz destacou na sua conferência aspetos como a redução dos salários médios entre as pessoas mais pobres dos Estados Unidos, nos últimos 6o anos, e o aumento dos recursos do grupo de um por cento dos mais ricos do país, que “mais do que duplicou” nos últimos 3o anos.

“A democracia americana vive hoje em função desse um por cento”, afirmou o economista, criticando as políticas económicas de trickle-down implementadas nos anos 8o, que conduziram a um acentuado agravamento das desigualdades, tanto de riqueza e de rendimento, como de oportunidades. Recordando que estas políticas assentam no pressuposto de que a prosperidade para os mais ricos se transforma em prosperidade para os mais pobres, o economista desabafou: “Gostava que fosse verdade.” E lamentou que muitos governos continuem a praticar estas políticas, deixando um aviso: “Se seguirem o modelo económico americano, vão reproduzir as mesmas desigualdades.” “O sonho americano e os Estados Unidos como ‘terra de oportunidades’ são um mito”, defendeu Stiglitz. “Digo sempre aos meus alunos para escolherem os pais certos”, afirmou, para sublinhar que as oportunidades dos jovens norte-americanos estão dependentes do nível de rendimento e educação dos pais.

Não é a economia, é a política

Joseph Stiglitz afirmou que “91 por cento da recuperação económica mundial foi para os um por cento com mais recursos” e criticou as celebrações de países europeus, como Espanha, pela redução das taxas de desemprego para valores ainda “inaceitáveis”. “Estão a celebrar o fim da recessão com uma taxa de desemprego de 28 por cento e de desemprego jovem perto de 50 por cento. Para mim, isso é uma depressão e não um motivo de celebração”, disse, lembrando ainda que muitos jovens emigraram, deixando de entrar nas estatísticas de desemprego. “Com a austeridade e com o aumento do desemprego, é difícil manter um crescimento económico no futuro, porque se está a destruir capital humano produtivo”, afirmou o nobel da Economia.

O economista defendeu finalmente que o mundo inteiro está perante uma situação de emergência devido a um “enorme aumento dos níveis de desigualdade” que exige a tomada de decisões radicais no curto prazo para inverter a tendência das últimas décadas. Reforçou que as economias com menos desigualdade económica e com menos desigualdade de oportunidades têm melhores resultados, com “um crescimento mais estável e uma menor frequência de crises”, deixando o apelo: “As decisões de hoje vão ter efeitos na desigualdade dentro de décadas.” “Sabemos que a austeridade reduz o desempenho das economias e promove a desigualdade”, afirmou Stiglitz, concluindo que a questão não está na economia, mas na política. E terminou a sua intervenção com uma interrogação: “Conseguiremos alcançaras mudanças políticas que levem a uma economia mais produtiva e a uma sociedade mais igualitária?

___________

Veja a conferência completa em http://livestream.com/fcglive/20151201DesigualdadenumMundoGlobalizado

Fonte: Biblioteca Pública Regional da Madeira