Tudo visando garantir o resgate da dívida externa, contraída por oferta “generosa” dos credores quando a liquidez mundial era farta, e ampliada no tempo por unilateral aumento posterior das taxas de juros.

Os governos Lula e Dilma passaram a fazer outra “lição de casa”, prioritária e imprescindível, a de implementar políticas públicas sociais e econômicas para combater a desigualdade, a grande chaga. De fato, esta se constitui em grave problema ético, o que destrói a solidariedade, exacerbando os conflitos sociais e, portanto, levando à violência. Tal situação impede a sinergia indispensável ao aumento da produtividade sistêmica, bloqueando a competitividade. A desigualdade social está na raiz do propalado “custo Brasil”. Estes graves problemas se acumulariam tão mais exponencialmente quanto mais se demorasse a enfrentá-la.
Além do mais, a democracia, que avança, exigiria que, cedo ou tarde, a desigualdade fosse enfrentada, sob pena de nova ruptura política, desta vez talvez sangrenta. De fato, a desigualdade se mantinha inexpugnável desde seu descobrimento e assim permaneceu no Brasil Colônia, Império, República, nos períodos ditatoriais e democráticos, nos ciclos do ouro, do gado, do açúcar, da borracha, do café, da industrialização, do agronegócio e da financeirização. Nunca se dobrava. Não havia mais tempo a perder. Era preciso enfrentá-la.
Assim, entre 2002 e 2012, livrados do FMI no primeiro mandato de Lula, as despesas sociais redistributivas foram aumentadas, em termos reais, em 183%. Destaquem-se os Benefícios aos Idosos e aos Deficientes de Baixa Renda, com 382%, e o Bolsa Família, com 606%. O salário mínimo aumentou 78% além da inflação, entre 2002 e 2013, o que propiciou aumentos reais dos benefícios previdenciários de um SM e dos salários em geral, mormente do setor de serviços.
Foi assim que a espinha dorsal da desigualdade foi quebrada. De 2002 a 2012, o Índice de Gini (termômetro da desigualdade), caiu de 58,7 para 52,6. A divisão entre a renda média dos 10% mais ricos e a dos 10% mais pobres passou de 40 para 23. O percentual de pessoas abaixo da linha de pobreza caiu de 23,3% para 10,2%.
A arrumação da casa tem, claro, um custo a curto prazo. A carga tributária subiu de 25% do PIB em 1993 para 34% em 2005, contida por aí até hoje. Apesar deste aumento, a carga tributária é insuficiente para suprir também o investimento público. Como os empreendedores não compreendem a necessidade de se propugnar pela harmonia social, inclusive para o aumento da produtividade sistêmica, retraem seus investimentos, e o país cresce pouco. Como os mais pobres, beneficiários da redistribuição, possuem maior propensão a consumir, tem-se também pressão sobre a inflação e redução da poupança, prejudicando o crescimento.
Mas a “lição de casa” a fazer continua sendo essa. Estamos com reservas externas elevadas, desemprego baixo, inflação controlada, PAC 1 e 2 em andamento, educação priorizada, setor privado com caixa para investir. Assim que a especulação com a eleição (como se fez com Lula) terminar, voltaremos a crescer. Abaixo com a tentativa do retorno às políticas neoliberais, como as propostas por Armínio Fraga e Eduardo Giannetti, conselheiros econômicos de Aécio e Marina. Queremos continuar a construir um Brasil para todos.
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(*) José Pascoal Vaz é economista, professor na Unisantos e pesquisador no Nese/Unisanta
Notas:
1) Quase todos os dados deste artigo são do livro de Marcos Mendes “Por que o Brasil cresce pouco?”, Elsevier, 2014, que recomendo.
2) Este artigo tem pequenas alterações em relação ao publicado originalmente em A Tribuna (03/09/14) sob o título “Fazendo a Verdadeira Lição de Casa”.