Quando, em setembro de 2013, Eduard Snowden, tornou público documentos que apontavam que a presidenta Dilma e assessores eram alvos de espionagem da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos, o debate acerca da construção de uma legislação que regulamentasse e protegesse os usuários da internet no Brasil, já ocupava a agenda de diversas entidades do movimento social, como o Fórum Nacional de Democratização da Comunicação, o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, o Instituto Proteste – Associação de Consumidores, entre outras organizações sociais.

Comemorar a conquista do Marco Civil da Internet é muito mais que vibrar pela sessão da Câmara dos Deputados deste 25 de março de 2014, ou pelo período de quatro meses, abrangido pelo requerimento de urgência que trancou a pauta da Casa Legislativa.

MCI é fruto de anos de produção colaborativa

Para se chegar a aprovação do texto do relator Alessandro Molon, muita água passou por debaixo da ponte. Segundo o site criado para debater o tema (http://marcocivil.com.br/) “a ideia do Marco Civil surgiu a partir da concepção do professor Ronaldo Lemos, expressa em artigo publicado em 22 de maio de 2007”.

Segundo o site o processo colaborativo de construção de um marco regulatório foi iniciado em outubro de 2009, recebendo mais de 800 contribuições, quando a Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça em parceria com o Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas no Rio de Janeiro propôs eixos para o debate que indicassem direitos e deveres dos internautas, prestadores de serviços e provedores de conexão, além de definir o papel do Poder Público com relação à Internet.

Blogueiros e ativistas digitais mobilizaram pelo MCI

As organizações da sociedade civil também se mobilizaram em torno da construção do marco civil da internet, como ocorreu durante o Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, em maio de 2012, em Salvador/BA, tendo sido o quarto seminário público realizado para discutir o tema.

A audiência pública reuniu ativistas digitais, os deputados federais Alessandro Molon (PT-RJ), relator do projeto, Jandira Feghali (PCdoB-RJ), os professores André Lemos e Wilson Gomes, da Universidade Federal da Bahia, o representante do terceiro setor no Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.BR), Sérgio Amadeu, e foi mediado pela jornalista Renata Miele, do Barão de Itararé.

Denúncias de Snowden deram visibilidade ao MCI

Nos últimos cinco meses, quando o Governo do Brasil, movimentado pelas denuncia de Snowden, o ex-agente norte-americano, as polêmicas se intensificaram em torno do projeto define os direitos e deveres de usuários e provedores de serviços de conexão e aplicativos na internet.

Questões como o direito a privacidade de informações dos usuários, impedindo que empresas utilizem estas informações e até vendam para empresas de marketing e vendas, ou ainda, utilizem o cruzamento de pesquisas e acessos com finalidade comercial, passou a ser pensada pelos internautas.

Outro tema que se tornou de conhecimento e reflexão pública, sendo este um dos fundamentais pelos movimentos de luta pela democratização da comunicação, foi a neutralidade na rede, ou seja, a necessidade do acesso universal de tráfego de conteúdos. O Brasil conhece bem o formato de TV à cabo que discrimina o acesso aos conteúdos e os internautas perceberam que, sem regulação, a internet poderia se tornar um ambiente de cobrança de pedágio e acesso diferenciado aos conteúdos da web.

Para o relator do projeto, deputado Alessandro Molon, a regulação por Lei significa a proteção da essência da internet como um território livre e democrático de circulação de informações, impedindo que os usuários sejam submetidos à regulação de mercado, cuja lógica é o lucro.

Participação social: determinante para as conquistas

Maria Melo, secretária executiva do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, FNDC, afirma que “a participação da sociedade civil se deu em vários momentos importantes do processo do Marco Civil, desde sua elaboração até sua aprovação”.

Segundo Maria, “em 2013, quando o projeto passou a tramitar em regime de urgência, não apenas movimentos e entidades historicamente ligados à luta pela democratização da comunicação e ao FNDC, mas também estudantes, centrais sindicais e movimentos do campo se mobilizaram, nas ruas, nas redes, nos gabinetes, para garantir essa conquista – que já é histórica – para o conjunto da nossa sociedade”.  Melo alerta para a continuidade da luta e convoca: “agora temos de manter a unidade e os esforços coletivos para a batalha no Senado”.

A deputada Jandira Feghali, avalia que “O Marco Civil da Internet é um projeto que nasceu fora do Congresso e floresceu dentro do Parlamento junto ao povo, às entidades organizadas e de luta. E neste escopo está o protagonismo e o embate de qualidade do Barão de Itararé, que a todo momento divulgou, esclareceu e movimentou parlamentares para sua votação positiva garantindo neutralidade de rede, liberdade de expressão e privacidade”.

Sônia Corrêa é do Instituto Barão de Itararé