Arnaldo Jabor, como era de se esperar, lançou sua retórica sobre o protestos que estão acontecendo pelas ruas de várias cidades do Brasil. Depois das manifestações da semana passada contra o aumento das passagens dos transportes públicos na cidade de São Paulo, Jabor, no Jornal da Globo, disse que era apenas uma manifestação de estudantes “de classe média” que “reclamavam 20 centavos”; chamou-os de burros, rancorosos, e ainda disse que não sabiam “pelo que lutar”. Concluiu que não valiam “nem 20 centavos”.

Pois Jabor, alguns dias depois na CBN, declarou que errou na avaliação do Movimento Passe Livre da cidade de São Paulo. Disse que eram “muito mais” do que manifestantes de uma causa anárquica. Disse que representavam uma “inquietação” do povo brasileiro. O ouvinte acostumado ao conservadorismo reacionário de Jabor, ao ouvir o início de suas declarações, talvez pensasse que a caduquisse da idade começava a lhe dar momentos de iluminação e que ele defenderia, com sua verborragia vazia e ufanista, os transportes públicos gratuitos como uma causa política justa.

Ledo engano. Ao ouvir a declaração inteira, percebemos que o elogio do jornalista aos manifestantes na verdade nada mais era do que uma forma, mais sutil, de continuar a construir seu discurso conservador. Jabor está, ainda, longe da caduquisse: continua firmemente alinhado à sua ideologia global. Seu elogio nada mais é do que a tentativa de abraçar a vontade de mudança das ruas dentro de seu discurso contrário à administração petista: na sua fala, escamotea as demandas concretas (como o passe livre, que ele, com certeza, não concorda) dentro de uma ”revolta total” contra o governo federal.

Mas não é apenas Jabor que busca construir uma ”revolta popular” antigovernista. A Folha de São Paulo hoje (18/06) traz em seu editorial sobre os protestos o seguinte trecho em destaque: ”muda o clima político no país; governo Dilma não tem respostas para inflação nem para saúde, educação, segurança e transportes”. O mesmo tom jaboriano, de que “o povo não aguenta mais este governo federal ineficiente”.

Podemos pensar que os protestos de São Paulo e do Brasil não trazem apenas demandas pontuais como a redução das tarifas. Mas como dizer que as milhares de pessoas que protestavam contra Marcos Feliciano protestavam diretamente contra Dilma? Como dizer que aqueles em São Paulo que pediam a saída do governador Geraldo Alckmin protestavam contra o governo federal? Ou ainda, que aqueles que expulsaram a rede Globo da manifestação de São Paulo protestavam contra Dilma? Só através de um discurso oportunista que é reproduzido diariamente pelos dinossauros da velha mídia.

Mostrar quais são as demandas pontuais de determinados grupos que compõem os protestos (sejam ou não relacionadas diretamente ao governo federal), é algo que seria esclarecedor e fruto de um jornalismo sério. Agora, juntar a todos no mesmo grupo e ainda comparar os manifestantes aos ”caras pintadas” (como fez Jabor em uma clara figura retórica anti-Dilma) é apenas um golpismo midiático típico dos grandes conglomerados da ”informação” que buscam reforçar sua ideologia anti-PT.

Tenhamos muita atenção quando Jabor elogia o protesto de nossas ruas. Quando isso acontece, é momento de realizarmos uma duríssima auto-crítica de como estamos organizando nossas pautas, de como expressamos nossa indignação. Não deixemos que as demandas pelo passe livre; pelo reconhecimento dos direitos dos homossexuais; pelo direito à terra e à moradia; contra o genocídio da juventude negra e pobre; e tantas outras que vêm engrossando as fileiras dos protestos pelo Brasil sejam mostradas como uma revolta anti-dilma generalizada. É necessário que se particularize os problemas, que se mostre onde é necessário mudar (como o Movimento Passe Livre que tenta a todo custo mostrar à população que a tarifa zero é uma questão política, e não técnica), e que protestemos contra o governo federal em nossas manifestações de forma pontual e inteligente, para demonstrarmos onde estão os erros e exigirmos as mudanças.

Se não tomarmos cuidado, começaremos a fazer onipresentes os chavões de Jabor dentro de nossos protestos.

Publicado em Carta Maior