Foram poucos minutos entre o anúncio da vitória de Horacio Cartes no Paraguai e o reconhecimento do novo presidente pelos adversários. Apesar das denúncias de fraude por parte de observadores internacionais e partidos de esquerda, a elite política paraguaia se concentrou em comemorar a menor taxa de abstenção da história do país (32%) e a suposta transparência da votação, que deve levar o Paraguai de volta ao Mercosul e à Unasul (União das Nações Sul-Americanas).

Além da avassaladora vitória do Partido Colorado, que ganhou a Presidência com 46% dos votos e 15 dos 17 governos departamentais do país, o resultado dessa eleição também mostrou um impressionante encolhimento da esquerda paraguaia. Muito atrás do segundo colocado – o liberal Efraín Alegre (37%) –, os candidatos da esquerda, somados, não chegaram a 10% do eleitorado.

Esse panorama poderia indicar que a maioria da população paraguaia está mais inclinada à direita. Porém, essa está longe de ser a verdade. Três fatores elementares sustentam a complexidade do resultado deste domingo. O primeiro é que, como a eleição é decidida em apenas um turno, paraguaios que optariam por candidatos fora do páreo principal acabaram escolhendo um dos dois primeiros colocados. Recebeu o voto o “menos pior”.

Não foram poucos os eleitores que relataram a Opera Mundi preferência por Mario Ferreiro, esquerdista mais bem colocado nessa eleição, com 5,9% dos votos. “Precisamos de pessoas novas na política, como ele. Com postura e ideias diferentes. Acho que ele é o melhor candidato, mas não quero que Cartes ganhe, então votarei em Alegre”, foi um dos argumentos escutados.

Evidentemente, a divisão da esquerda paraguaia, que lançou cinco candidatos presidenciais, teve influência direta no fracasso eleitoral. Além da união dos votos de todos esquerdistas, um candidato eventualmente unificado sofreria menos com o voto útil.

Golpe e aliança

O segundo efeito veio com o desenrolar do golpe de Estado contra Fernando Lugo, em junho de 2012. Nos últimos dez meses, o PLRA (Partido Liberal Radical Autêntico) de Federico Franco recebeu uma série de denúncias de corrupção. Além disso, Franco e o partido carregam a pecha de “golpistas” entre uma parcela considerável da população, inclusive entre aqueles que não apoiavam Lugo. Natural, portanto, que os eleitores quisessem “punir” os liberais.

No entanto, as seis décadas de administração colorada também foram repletas de irregularidades. O que explicaria então a guinada em direção aos colorados? A habilidade de Cartes de se descolar do histórico de falcatruas do próprio partido é uma das razões. Por ser milionário, o candidato teria menos chances de “roubar”, apontaram paraguaios que votaram nele.

Por fim, a desastrada aliança firmada de última hora pelo PLRA com a Unace (União Nacional de Cidadãos Éticos) – fundada pelo ex-general colorado Lino Oviedo, morto em fevereiro deste ano – também prejudicou Alegre. Diferentemente dos líderes do partido, os oviedistas preferiram apoiar os colorados.

Dessa forma, uma reforma política no Paraguai é tão ou mais urgente do que no Brasil. No país vizinho, porém, essa possibilidade está ainda mais distante, já que os dois partidos tradicionais controlarão a esmagadora maioria do Congresso. Do jeito que está, colorados e liberais continuarão controlando o país por pelo menos mais cinco anos. O Paraguai pós-golpe tem cara de déjà vu.

Publicado em Opera Mundi