Damasco – Os EUA hesitam, a Turquia alimenta segundas intenções e o Estado de Israel está mergulhado em stand-by estratégico. Está algo mais que claro: ninguém reúne condições para apor, decisivamente, seu carimbo nas evoluções na Síria no dia seguinte da queda do sitiado regime de Bachar Al Assad.

Esta incerteza é, também, o fator mais forte da prorrogação de permanência no poder do regime Baath, muito mais pelo apoio das minorias do país – alauítas, muçulmanos, druzos, cristãos e curdos – da ajuda que continua proporcionando o Irã, assim como do apoio cada vez mais “morno” da Rússia.

Sem sombra de dúvida, as evoluções internas no Egito e na Tunísia – isto é, se em relativamente curto espaço de tempo for comprovada a incapacidade dos respectivos governos que pertencem ao Islã político moderado – contribuírem, examinando com mais cuidado seu envolvimento na Síria.

Quer dizer, se a dinâmica da autoritária digressão conservadora islâmica comprovar-se, claramente, no Egito e na Tunísia, quem poderá garantir o que poderá acontecer na Síria, onde o inicialmente eclodido conflito étnico e tribal já assumiu a dimensão e a feição de guerra civil entre a maioria árabe sunita e as minorias religiosas que mantêm alinhados seus interesses vitais com o regime de Assad.

É óbvio que a prorrogação de incerteza na Síria fortalece, objetivamente, o papel catalítico intervencionista da Arábia Saudita, do Catar e dos demais principados, sultanatos, emirados e califados do Golfo Pérsico que fomentam um modelo islâmico, o qual só preocupação pode inspirar, não só no Ocidente, mas também no Estado de Israel de Benjamin Netaniahu, assim como na própria Turquia de Retzep Tayyip Erdogan.

Vácuo de Kadafi

O risco é visível. Se em 2011 existiam expectativas, perspectivas e ilusões de que o islã político no Egito e na Tunísia cobriria em apenas alguns, poucos, meses a distância que separava Erbakan de Erdogan, na Turquia, hoje a mais conservadora feição governamental do islã sunita, mesmo disseminada na Península Árabe, corre o risco de predominar na Síria e derrubar totalmente equilíbrios periféricos, assim como desviar de sua marcha a dinâmica de democratização da Primavera Árabe.

Conforma-se assim um ambiente periférico em que nada é fundamento: sequer as relações Washington-Teerã, muito menos a posição final da Rússia, enquanto ninguém poderá excluir intervenção externa (leia-se invasão de potências ex e neocolonialistas) e envolvimento na guerra civil síria, com desconhecida – por enquanto – composição da “coalizão dos bem dispostos” que assumirá a tarefa de materializá-la.

As confusas situações no Egito e na Tunísia não são as únicas, inesperadas e detestáveis para o Ocidente consequências da Primavera Árabe que surgem. A África subsaariana inteira, desde o Sudão, Chade, Niger e Mali, até a Mauritânia e Nigéria, encontra-se à sombra de uma superatividade de organizações extremistas, fundamentalistas tipo Al Qaeda, as quais ocupam o espaço vazio criado em consequência da derrocada do regime e do assassinato de Muammar Kadafi, na Líbia, que investia nas divergências tribais-religiosas da região.

Os EUA, sitiados ainda pela crise fiscal, não desejam e não podem envolver-se em novas frentes após sua retirada do Iraque e sua já em curso retirada do Afeganistão, enquanto a França, sozinha, sem o apoio da Alemanha e da União Européia – por intermédio da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) – tenta “estabilizar”, sem ter sido convidada, a África subsaariana por ter sido por ela “colonizada” e, mais ainda, por ser “francófona”. Tudo indica que, na Síria, a dinâmica das evoluções está fora de controle.

Sucursal do Grande Oriente Médio.