A disputa final foi por causa de dez empréstimos de mais de 100 milhões de dólares que correspondiam a créditos tomados pela última ditadura militar e a passivos das empresas de serviços públicos que foram privatizadas. O ministro negou-se a cancelar esses créditos e o Clube de Paris acabou por aceitar. No Ministério da Economia consideram que o acordo quanto à forma de pagamento – o último ponto que resta negociar – está próxima. A Argentina propõe, tal como nas negociações com os credores privados de 2005 e 2010, uma renegociação que permita que o Estado não dependa dos mercados internacionais de crédito para o seu cancelamento. Está disposta a pagar aproximadamente 1500 milhões de dólares por ano. Assim, o prazo de pagamento estender-se-ia a cinco anos e meio. O clube de potências estrangeiras, que começou por exigir um pagamento à vista, aproximou-se para aceitar um financiamento a três anos. Por causa dessa diferença se está a discutir. A Alemanha é o país mais renitente em aceitar a proposta.

A equipe económica está a negociar mais de 200 empréstimos, tomados junto a 50 empresas de 16 países. Uma alta fonte do Ministério da Economia explicou a Página/12 o processo de negociação: "A partir de 2010 reiniciou-se o processo de negociação com o Clube de Paris, para o efeito de cancelar as dívidas pendentes com os países membros. Paralelamente levou-se a cabo um processo de conciliação de dívidas, consistente em estabelecer quais são elegíveis para a sua negociação e reestruturação no âmbito do Clube, quais são os montantes de capital de cada uma, as taxas de juros aplicáveis e a metodologia estabelecida nos contratos para a aplicação de juros e punições, do que resultou o total de cada dívida numa data determinada".

Na pasta económica asseguram que todas as dívidas que se incluíram têm como fundamento contratos acordados aquando do 10 de Dezembro de 1983. Isto levou a recusar várias reclamações de credores, que somavam mais de cem milhões de dólares, que pretendiam incluir supostas dívidas baseadas em contratos efectuados durante a ditadura militar, não validadas por um governo democrático, as quais não se consideraram legítimas. "As discussões as respeito com a agências oficiais dos países reclamantes consumiram uma parte importante do processo, mas a decisão manteve-se firme no sentido de não admitir estas reclamações (ver nota )", assinalou uma fonte do Ministério da Economia.

NEGOCIAR SEM A PRESENÇA DO FMI

Pelo peso das suas economias e pelos montantes envolvidos em cada caso, há cinco países que estão a definir a negociação: Estados Unidos, Japão, Espanha, Itália e Alemanha. Os Estados Unidos foram o país que teve maior influência para que o Clube acedesse ao pedido da Argentina de negociar em o "guarda-chuva" do Fundo Monetário Internacional. O Japão e a Espanha têm um lobby forte das suas empresas para acordar com a Argentina e assim destravar a possibilidade de fazer negócios que hoje estão vedados devido ao incumprimento (default) com o Clube. A Alemanha, governada por uma administração em geral pouco flexível nas suas negociações, carrega o estigma de aceitar as condições excepcionais que propõe a Argentina no momento em que impõe severos processos de ajuste a países europeus que atravessam momentos difíceis. O governo italiano alinha-se com a Alemanha.

As negociações com o Clube de Partis estão padronizadas. O processo habitual assinala que uma condição necessária para começar a negociação é que o país devedor tenha um acordo standby com o FMI ou que cumpra com o artigo 4, que exige uma revisão anual das contas nacionais. Com este requisito cumprido, o Clube apresenta um menu de financiamento pré-estabelecido, segundo as condições de cada país. O devedor só pode escolher uma opção desse menu.

A Argentina apresentou-se para negociar depois de permanecer nove anos sem manter contactos oficiais para reabrir a negociação, não aceitou a inclusão do FMI na negociação e apresentou a sua própria proposta, sem aceitar um menu pré-estabelecido unilateralmente. "Esta situação incomoda os integrantes do Clube: estão a percorrer um caminho desconhecido e custa-lhes validá-lo", assinalou a Página/12 uma fonte do Ministério da Economia. "Uma das preocupações é que a Argentina estaria a criar um precedentes para casos futuros", acrescentou. Apesar disto, as posições não são homogéneas entre os países com maior peso na negociação: há os que vêem que a Argentina vem pagando a sua dívida, que apresenta uma proposta razoável e que querem voltar a fazer negócios.

A posição argentina é que o acordo é útil para o país só nas condições propostas. "Um acordo difícil de cumprir geraria desconfiança nos mercados e acabaria por ser negativo para o país", é a opinião do governo nacional. No Ministério da Economia querem acordar com o Clube de Paris não só o encerramento definitivo do capítulo do default nacional, também para que possam chegar ao país investimentos directos com financiamento a longo prazo e taxas de juros baixas.

Devido ao forte crescimento da economia nos últimos oito anos, o país requer obras de infraestrutura de alto preço. Há empresas internacionais que se estão a financiar a 20 anos a taxas de 2 por cento ao ano e que poderiam oferecer prazos semelhantes uma taxa de juros de cerca de 4 por cento ao ano. Mas essas empresas só conseguem as condições adequadas de crédito com a garantia de entidades oficiais dos países do Clube de Paris. Há agências de garantias, como Ermes, Coface, Securitas eJVIC, entre ouras, que esperam o acordo do Clube para fazer negócios com as empresas que querem despejar capital na Argentina para realizar obras de infraestrutura.

Outro elemento que o governo considera é que o acordo dispararia mudanças na nota que as classificadoras de risco decidem para o país. Uma subida na qualificação permitiria a alguns fundos de pensão habilitar créditos para empresas argentinas e investir em títulos públicos nacionais, facto que redundaria numa baixa de juros no país. Contudo, afirmam na equipe económica, o país não prevê acelerar o acordo. "A bola está com eles, a Argentina já definiu a sua posição; agora há que esperar que os mesmos lobbies dos interessados em investir no país desbloqueiem as últimas resistências".

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O original encontra-se em http://www.pagina12.com.ar/diario/economia/2-168182-2011-05-15.html

Fonte: Resistir.info