Ao cair da tarde do sábado passado eclodiu então o aguardado ataque dos EUA e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) contra a Líbia, com objetivo a violenta derrubada de Muamar Kadafi e, em continuação, a pilhagem do petróleo e do gás natural do país pelos bucaneiros norte-americanos e europeus.

Após alguns simbólicos – de caráter visível de propaganda – primeiros ataques aéreos, executados por caças-bombardeiros franceses, a serviço das necessidades pré-eleitorais de Nicolas Sarkozy, assumiram a continuação os EUA, lançando 112 mísseis Tomahawk contra instalações de baterias antiaéreas do regime de Kadafi.

O ataque aéreo desfechado, como de hábito, sem declaração de guerra pelos EUA/Otan, alterou radicalmente o caráter dos conflitos na Líbia. Até agora havia uma guerra civil, com Kadafi tingindo suas mãos com o sangue de seu povo.

Kadafi não enfrentou, obviamente, uma espontânea insurgência de massas desarmadas que pediam, pacificamente, sua saída do poder. Ao contrário, enfrentou uma insurgência organizada e armada, a qual, com base em plano militar elaborado, conquistou, inicialmente, o controle das maiores cidades líbias, para perdê-lo mais tarde, assim que foi iniciado o contra-ataque das forças militares de Kadafi. Isto, naturalemente, não elimina o fato de que Kadafi tingiu suas mãos no sangue dos líbios.

Entretanto, a partir do momento em que foi iniciado o ataque dos bucaneros norte-americanos e europeus, o caráter da guerra alterou-se objetivamente. A guerra civil depreciou-se de certa forma e em primeiro plano eclodiu a guerra nacional defensiva contra os invasores estrangeiros.

O tiranete Kadafi assumiu – graças às circunstâncias – a liderança das forças líbias que defendem o território de sua pátria contra a maquinação estrangeira. Concordem ou não, esta é a objetiva realidade, por mais que Kadafi de hoje seja abominável sem nenhuma relação com o popularíssimo líder do passado.

Governo de fantoches

Também, concordem ou não, as forças de oposição a Kadafi que convidavam os EUA e a Otan para bombardearem seu país e matar Kadafi, para em seguida receberem o poder, tornam-se colaboradores dos invasores estrangeiros contra seu próprio país.

Qualquer governo que se originar de suas hostes não será nada mais do que um triste governo de fantoches dos estrangeiros, o qual servirá cegamente a seus interesses, concedendo-lhes, naturalmente, a título de gratidão, a liberdade de pilharem o petróleo e o gás natural da Líbia.

O fato de Kadafi ter se tornado um "amigo fiel" dos norte-americanos e europeus na última década e, particularmente, nos últimos cinco anos, assim como o fato de seu outrora regime populista – que melhorou espetacularmente a vida dos líbios – ter se corrompido em cleptocracia familiar, não anula o fato de o regime de oposicionistas fantoches que se instalará no poder graças às baionetas dos EUA e da Otan ser, por definição, muito pior sob o ponto de vista moral. Anotem, isto será comprovado também na prática, a exemplo de como aconteceu no Afeganistão e no Iraque, após a ocupação dos dois países pelos EUA e Otan.

O papel de Kadafi como líder dos líbios, que, no âmbito da guerra em defesa da pátria, enfrentam os invasores estrangeiros, não deverá provavelmente salvar-lhe a vida. Guerras análogas travaram tanto Slobodan Milochevitz, quanto Saddam Hussein, e ambos foram mortos, o primeiro executado médico-cientificamente, enquanto o segundo foi enforcado com transmissão ao vivo pela televisão.

Constitui embuste para consumo da opinião pública mundial a informação de que supostamente a Liga Árabe aprovou o ataque aéreo dos EUA/Otan contra a Líbia. De fato, a Liga Árabe concordou com o ataque contra a Líbia.

Mas dissimula-se um fato de fundamental importância: a Liga Árabe é composta de representantes de todos os governos autoritários árabes, contra os quais já se insurgiram seus povos para derrubá-los. Isto é, votaram a favor do ataque contra a Líbia todos os governos de Estados árabes que estão massacrando seus povos. Estes árabes açougueiros votaram a favor dos EUA/Otan.

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Fonte: Monitor Mercantil