Em inferno político-diplomático transformou-se Kosovo após as eleições parlamentares de 12 de dezembro do ano passado. Isto não se deve, somente, ao fato de que os resultados das urnas tornam penoso e, provavelmente, prolongado processo a formação de governo (o primeiro partido recebeu apenas 33,5% dos votos, o segundo, 23,6%, o terceiro, 12,2%, e o quarto, 10,8%, mas o quarto, terceiro e segundo recusam-se a compor coalizão com o primeiro).

O instável cenário político complicou-se, extremamente, após a intervenção pós-eleitoral indireta da Alemanha, Grã-Bretanha, França e EUA, os quais, dedicam-se a um selvagem poquer político entre si com objetivo de aumentarem sua estreita influência individual sobre as evoluções políticas de Kosovo e, indiretamente, sobre os demais países balcânicos. Efetivamente, seus lances são, de fato, impressionantes.

As eleições foram realizadas num domingo (12 de dezembro passado). Assim que foram conhecidos os resultados extra-oficiais na segunda-feira, imediatamente, começaram a cair as "bombas políticas".

Os EUA foram os primeiros a abrir o jogo e, pelo fato de o primeiro partido ser do primeiro-ministro em fim de mandato – e extremamente filo-norte-americano – Hassim Thatsi, o Departamento de Estado apressou-se a reconhecer o resultado eleitoral, com o representante da diplomacia norte-americana, Mark Toner, elogiando a "evolução democrática de Kosovo", apesar das inúmeras denúncias de gritantes casos de fraudes formuladas pela oposição política do país.

Aliás, Toner destacou a "necessidade impositiva" de início imediato do diálogo Kosovo-Sérvia, "imediatamente após a oficialização dos resultados eleitorais". No dia seguinte, o Conselho da Europa divulgou um relatório libelo do senador suíço Dick Marty sobre Kosovo, no qual acusa diretamente o primeiro-ministro do país de liderar uma gangue de pistoleiros kosovares, que assassinou entre 1999 e 2000 um número não confirmado de sérvios e albaneses e vendeu seus órgãos a clínicas do exterior especializadas em transplantes.

"Jogada" abortada

O senador Marty, considerado homem que representa a influência da Alemanha, tornou-se mundialmente conhecido pelas denúncias que formalizou em outro relatório sobre as prisões secretas que a Agência Central de Inteligência (CIA) dos EUA mantém em vários países da Europa, nas quais a CIA torturava suspeitos de ações terroristas, que haviam sido sequestrados em vários países do mundo.

As primeiras informações sobre este relatório de Marty foram reveladas graças a um "furo" do jornal britânico The Guardian. E sabe-se que a Grã-Bretanha nunca fez segredo de seu apoio ao adversário de Thatsi, ex-primeiro-ministro Ramus Haradinai, o qual deverá ser julgado pelo Tribunal Internacional de Haia por crimes de guerra cometidos na antiga Iugoslávia, denuncia o jornal francês Le Monde.

Este, aliás, questiona diretamente: "Porque este relatório foi publicado em um momento político tão neutro?" Pouco antes das eleições parlamentares em Kosovo, o Tribunal Internacional de Haia proibiu Haradinai – cujo partido foi classificado em quarto lugar, com 10,8% de votos – de viajar provisoriamente a Kosovo até o início de seu julgamento.

Ao que tudo indica, Haradinai queria negociar pessoalmente com Thatsi o apoio e a aliança com seu partido, com objetivo de formarem governo no qual Haradinai seria vice-presidente, o que impossibilitaria sua condenação pelo Tribunal Internacional de Haia, que acabou torpedeando a "jogada".

Grande Albânia

Assim, a atual conformação do panorama político em Kosovo é a seguinte: EUA e França apoiam o mafioso e criminoso de guerra Thatsi. A Grã-Bretanha, o igualmente criminoso de guerra Haradinai. Já a Alemanha apoia um politicamente muito perigoso albanês líder de Kosovo, embora ele não seja acusado de um passado semelhante dos outros dois. Ele chama-se Albin Kurti e lidera o partido Autodeterminação, que disputou pela primeira vez eleições parlamentares, classificando-se em terceiro lugar, com 12,2% de votos.

A particular característica deste partido é que é o único partido político de Kosovo que defende abertamente a união de Kosovo com a Albânia, criando assim a Grande Albânia, além de exigir a imediata retirada do país de todas tropas estrangeiras (EUA-União Européia-Organização do Tratado do Atlântico Norte).

Mas as exigências do Partido Autodeterminação não param aí. Exige ainda a abolição do parágrafo 3 do artigo 1 Constituição da imposta pelos EUA e União Européia. Com base neste parágrafo, Kosovo assume a obrigação de não formular exigências territoriais contra qualquer país vizinho e sequer tentar união com algum país ou parte dele. Este artigo inviabiliza a criação da Grande Albânia.

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Fonte: Monitor Mercantil