O jornalista José Carlos Ruy faleceu nesta terça-feira, 2 de fevereiro de 2021, deixando saudades, um legado e uma perda enorme para o Partido Comunista do Brasil e para a luta do povo brasileiro. Muitas homenagens foram feitas. Muitos quiseram se manifestar. Não eram poucos aqueles que se impressionaram a figura de Ruy. Muitos sentimentos foram enviados à família.

Um infarto fulminante tirou a vida do escritor e historiador, aos 70 anos de idade. Sua carreira começa ainda nos anos 1970, em plena ditadura militar, assim como era militante do PCdoB desde 1972, mesmo não podendo se filiar devido aos vínculos com a Editora Abril.

Ruy deu sua contribuição analítica e intelectualmente sofisticada a publicações como a revista Princípios, a revista Debate Sindical, o jornal A Classe Operária, o portal Vermelho, o portal da Fundação Maurício Grabois, o jornal Movimento, a revista Reportagem e a Retrato do Brasil. Brindou livros com prefácios entusiasmados e traduziu muitos textos seletos para a compreensão da geopolítica internacional. Sua contribuição também está presente em coletâneas de artigos, assim como em suas próprias obras como Os comunistas na Constituinte de 1946 e Biografia da nação. Na coletânea 100 anos da Revolução Russa, escreveu o artigo A Revolução de 1917 e a luta contra o racismo, um tema do qual teve profunda proximidade na Unegro e no Instituto Brasileiro de Estudos Africanistas (IBEA). Deixou, inéditos, entre outros, dois trabalhos: um sobre a obra de Machado de Assis e outro sobre a luta antirracista.

Em nota divulgada nesta terça-feira (2), a Comissão Executiva Nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) lamenta a morte do jornalista José Carlos Ruy e enaltece o legado do militante que faleceu hoje, aos 70 anos. “O PCdoB perdeu um dos seus militantes mais valiosos e o Brasil um de seus fecundos intérpretes”.

“O labor intelectual de José Carlos Ruy, à luz do marxismo, abarcou temas e campos diversos e sempre a partir do que era relevante para a luta de classes a cada circunstância política e histórica. Mas, pode se afirmar que o Brasil, sua história, sua formação econômica e social, suas classes sociais, seus grandes problemas e as reflexões de fundo para superá-los, foi seu grande objeto de pesquisa e estudo”, diz um trecho da nota.

Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo também emitiu nota em que lamenta o falecimento. Lembra que Ruy foi membro da diretoria do Sindicato dos Jornalistas de 1997 a 2003, sendo diretor e secretário de relações sindicais e sociais. “O Sindicato dos Jornalista se solidariza com amigos e familiares e transmite os mais profundos sentimentos pela morte do jornalista e ex-diretor da entidade.”

A presidenta nacional do PCdoB e vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos, lembrou a influência de Ruy sobre outros jornalistas que trabalharam em veículos sob direção do PCdoB. “A Classe Operária, jornal do nosso partido, tem muito do seu DNA, do seu suor e do amor pela comunicação. Gerações de comunicadores do nosso partido cresceram sob seu exemplo, influência e carinho”.

“José Carlos Ruy foi um grande jornalista. Um militante e dirigente comunista disciplinado, ativo e dedicado. Mas foi sobretudo um homem sensível, atencioso e delicado. Uma pessoa humana ímpar”, registrou Luciana. “É doloroso saber da sua partida.”

Renato Rabelo, presidente da Fundação e dirigente do PCdoB, foi um dos companheiros de Ruy que lamentaram sua morte: “A morte do nosso grande camarada José Carlos Ruy é uma perda que deixa imensa lacuna. Era um destacado militante intelectual do nosso Partido, abnegado lutador da causa comunista e civilizacional. Deixa extenso e rico legado que nos inspira e nos fortalece”.

“Como amigo e companheiro na equipe do Vermelho, Ruy foi como um irmão mais velho para mim”, afirma Inácio Carvalho, editor do portal desde 2015. “Nos últimos cinco anos, desde que assumi a editoria do portal, nos falávamos praticamente todos os dias, sobre os mais diversos assuntos – trabalho, acontecimentos políticos, cultura e a vida. Sempre muito disposto, afável e esperançoso na luta do povo, Ruy era um inspirador para quem acredita numa vida melhor, nos seres humanos, na vida e no socialismo. Ruy continua imprescindível e seguirá nos inspirando através de sua obra.”

O jornalista e escritor Osvaldo Bertolino falou de sua intimidade intelectual com Ruy, assim como pela afinidade na apreciação de cachaças. “Foi daqueles amigos que a gente se entendia à perfeição no plano intelectual. Ele com uma cultura geral muito superior, o que lhe conferia, na nossa convivência, um intenso trabalho para corrigir e avalizar o que eu produzia”, diz o escritor, que sempre pedia a Ruy uma leitura de suas produções biográficas. 

“Bebemos, rimos, falamos de tudo e não pudemos nos despedir. Minha última conversa com ele se deu no domingo dia 22 de novembro de 2020. Com a quarentena da pandemia da Covid-19, falávamos por telefone. Ele me ligou para conversarmos. Sugeri uma conversa pela internet, transmitida ao vivo. E saiu uma deliciosa Roda de Conversa. Lamentamos não podermos tomar uma bela cachaça para festejar aquele momento. E assim ele se foi, como me disse uma vez sobre a morte de seu irmão mais velho, no momento em que a gente mais precisava dele”.

Osvaldo ainda lamenta a perda e expressa o choque que significa. “Ainda não é possível, para mim, dimensionar o vazio que se abre com a sua morte. Talvez nunca seja. Fico sem uma das mais importantes interlocuções que consegui na vida”. 

A trajetória de Ruy foi resgatada pelo mesmo Osvaldo Bertolino, que lembrou cada uma das paixões jornalísticas dele. Assim como a trajetória pessoal e íntima foi narrada pelo irmão mais velho, Marcos Aurélio Ruy. 

“Para mim o maior intelectual do Partido Comunista do Brasil, um dos grandes pensadores marxistas brasileiros, mas uma pessoa humilde, simples como deve ser todo comunista. Com uma generosidade e uma integridade ímpares, mesmo nas mais acaloradas discussões”, disse o irmão, sem modéstias. Marco Aurélio diz que aprendeu com ele que a luta antirracista, por igualdade de gênero e por respeito a todas as pessoas, a todas as vidas caminham lado a lado. “E num país como o Brasil, a revolução passa por entender a necessidade de acabar com o racismo, o machismo, o sexismo e a LGBTfobia. Além de colocar a questão cultural no lugar que a cultura merece”.

O jornalista e escritor Urariano Mota escreveu um “texto de urgência” expressando sua raiva com o falecimento do amigo. “Como podem pessoas, que nunca se viram antes, terem um encontro fraterno, rico, só possível em velhos amigos? É que os comunistas têm isso, e quem não é não sabe o que está perdendo”.

Mota falou de suas saborosas lembranças de noitadas com Ruy. “Eu via Ruy, à penumbra da noite, falar de literatura, do Vermelho, da cultura, da literatura, da história do comunismo no mundo, com propriedade e erudição, sem ar professoral. Ele falava como um amigo que é um outro de nós. Entendem?”

Falou também de como Ruy contribuiu imensamente para sua literatura. “Eu tenho com esse homem que se foi sem aviso ou queixas uma dívida impagável”. E reflete sobre a perda. “Um amigo que falece é uma parte de nós que também falece. Ficamos sempre menores, pois de nós se arranca uma parte do nosso ser. E de um ponto de vista menor, terrível, uma voz nos sussurra de um anjo cruel e inapelável: “Serás o próximo”.

O médico e vice-prefeito do Recife, Luciano Siqueira, também homenageou o amigo. “Estará sempre presente na memória dos que seguem a sua luta pela liberdade, pelos direitos do povo, pela soberania nacional e pelo socialismo”.

Aloísio Sérgio Barroso, diretor da Fundação Mauricio Grabois, destacou a excepcionalidade de Ruy. “José Carlos Ruy, revolucionário e comunista foi antes de tudo uma excepcional figura humana. Cultivava, além, uma simplicidade rara num intelectual de sua estatura. Estudioso e detalhista nas pesquisas, há algum tempo via-o como um pensador aberto às novas descobertas, opiniões e críticas, notadamente no terreno da História, sua paixão visível. Seu último trabalho de fôlego publicado foi “Biografia da nação, História e luta de classes” é uma contribuição sólida, muito bem argumentada, corajosa e polêmica. O PCdoB e o Brasil perderam um de seus melhores intérpretes”.

A jornalista Renata Mieli, portal Grabois, falou das lições que ele deixou para jovens jornalistas e do carinho que tinha por sua pesquisa em pós-graduação. “Um amigo se foi hoje. Não ouviremos mais sua voz calma. Não teremos mais aquele aperto de mão forte, apesar das mãos finas. Aprendi muito com o Ruy. Um jornalista dos mais experientes com quem já trabalhei. Cada palavra colocada no seu texto tinha um propósito cirúrgico. Texto elegante e sempre contundente, com poucos adjetivos, porque os que dominam a arte da escrita não precisam se ancorar nessas muletas da língua”.

Renata mostra que Ruy sempre tinha tempo para todos de que se aproximava, como revelam os inúmeros relaos. “Generoso e alerta com os mais jovens, como eu. O Ruy sempre foi um entusiasta das minhas ideias e, porque, não loucuras. Mesmo depois de deixarmos de trabalhar juntos, mantivemos conversas longas sobre projetos. O mais recente entusiasmo do Ruy foi com o meu ingresso na pós-graduação. Passamos a trocar muitas ideias sobre o desenho do meu projeto, e ele sempre dizendo para eu não ter medo e seguir em frente.

Agora não vou mais poder ‘encher o saco dele’ com as minhas dúvidas, meus pedidos de referências bibliográficas, meus dilemas. Uma das pessoas mais amáveis, gentis e inteligentes que eu tive a oportunidade de conviver. Adeus Ruy, saudades eternas”.

O jornalista Antônio Carlos Queiroz também dividiu redação com Ruy. “Algumas das características que me chamaram a atenção nele, desde o início, foi a seriedade, a discrição, e a calma em qualquer discussão. Talvez fosse sério demais, embora soltasse sonoras gargalhadas volta e meia”.

Para ele, o Ruy vai fazer muita falta entre as fileiras dos que batalham para transformar o Brasil numa república democrática, popular e socialista.