1.

preciso construir um forte
onde debruçar o meu cansaço
isso nem tudo que faço
e o meu impulso para a morte.
um forte de tal forma forte
que concreto seja-lhe o corpo
e de aço a derme que lhe faço
para que preso entanto absorto
eu me fixe em mim como noutro
fazendo-me vário ainda que uno
e um tanto muito mesmo que mero:
eu seja o mestre do meu aluno.

2.

depois, basta-me a batalha
o duelo de mim para comigo
certo de que, em meu dentro,
habita o indisfarçado inimigo.
que eu seja guerreiro e abrigo
seja mais: alvo e balaço
que acertado caiu de todo
que atirado perdeu espaço.
e assim aliado e traidor
serão um só e mesmo ente:
que eu mesmo me elimine
que eu próprio me invente.

 

A arte de embrulhar metáforas
Pio Vargas