Todo dia é dia de alguma coisa. Afora aqueles que têm uma justificativa histórica, ou seja, os dias que comemoram a recorrência de um evento marcante na evolução da sociedade humana, ou que, simplesmente, assinalam momentos do calendário tradicional, outros são apenas pretextos criados pelos artifícios do marketing para o comércio e outros serviços faturarem algum. Nada contra. Afinal, todos nós fazemos parte da mecânica consumista, geradora de benefícios recíprocos.

      Mas há datas que deveriam significar principalmente um incentivo à continuação de certos movimentos sociais legítimos em busca da plena cidadania de todos os seres humanos. É o caso do Dia Internacional da Mulher (8 de março) que deveria ser um marco anual para comemorar as mais recentes conquistas em direção à emancipação total de meia parte da humanidade. No entanto, a impressão que se tem, pela fragilidade e/ou inoperância das entidades públicas e privadas, que ainda agitam com  desânimo essa bandeira, é que o processo parou no meio do caminho e que as mulheres deste ou daquele país, desta ou daquela etnia, desta ou daquela condição social estão conformadas com o que conseguiram até agora. Ainda que tenham ficado com o pedaço mais espinhoso desse nosso latifúndio.

      Tudo indica que a luta pela causa universal da emancipação da mulher perdeu a oportunidade histórica e cada pedaço do mundo estabeleceu suas fórmulas conciliatórias de acordo com suas tradições culturais, seus sistemas políticos, suas conveniências econômicas e, sobretudo, com suas crenças, seus conceitos e preconceitos religiosos. A própria mulher ocidental (Europa e Américas), que parece ter sido a melhor aquinhoada nas concessões políticas para desfrutar de uma cidadania igualitária, sofre, na prática, limitações e sobrecargas. Com direito a votar e a ser votada, tem, no entanto, uma presença pouco significativa na administração dos Três Poderes, devido a uma cultura machista que não se rende à nova realidade. Quanto ao trabalho, freqüentemente tem que carregar dois fardos ao mesmo tempo: um, no espaço produtivo que ela conquistou, igualando seu desempenho ao dos homens; outro, no espaço doméstico, que só recentemente começou a ser partilhado por alguns homens, dispostos a trocar fraldas de bebês e lavar a louça do jantar. Claro, porém, que qualquer uma dessas mulheres deve achar, apesar das limitações, seu modo de vida maravilhoso ao se comparar, por exemplo, às muçulmanas árabes, blindadas de preto da cabeça aos pés e em constante estado de submissão e obediência ao pai ou ao marido, seus tutores e senhores das suas vidas.

      Por outro lado, elas – as mulheres ocidentais – se dizem consciente da inviabilidade, hoje, de qualquer ação de resgate da dignidade de mulheres de outras bandas do mundo. Portanto, só resta mesmo é o conformismo.

      Mas para a data não passar em branco, que tal uma festinha de confraternização entre amigas ou coleguinhas de ofício? Se ela ficar um pouco insossa, paciência; não será a primeira nem a última vez que acontece, quando não se têm muitas coisas a dizer (ou não se quer dizê-las?).

P.S. – Para quem não sabe, aqui vão algumas informações sobre a data de 8  de março (que não citei no texto principal para não dramatizá-lo), eleita para comemorar o Dia Internacional da Mulher;

1)   Nesse dia, em 1857, as tecelãs de uma fábrica americana situada no subúrbio de Nova Iorque, se atreveram a promulgar uma greve em busca da equiparação com os homens de sua remuneração e de seu horário de trabalho. O dono da fábrica, nauseado com a ousadia de mulheres pobres e socialmente insignificantes, resolveu tocar fogo no pavilhão aonde as operárias estavam entrincheiradas. Cerca de 130 delas morreram carbonizadas.

2)   Durante uma conferência na Dinamarca, em 1910, a data recorrente  desta crueldade foi escolhida para comemorar o Dia Internacional da Mulher.

3)  Somente em 1975, a data foi oficializada pela ONU.

4)  Um dos últimos países ocidentais a instituir o voto feminino foi o Brasil – 1932.