O dia 15 de maio foi marcado por vigílias e protestos em várias cidades do mundo para lembrar o 67º aniversário da Nakba, palavra em árabe que significa catástrofre. É assim que o povo árabe, especialmente os palestinos, lembram o dia 15 de maio de 1948, o dia seguinte à criação do Estado de Israel. A partir daquele momento, 750 mil palestinos tiveram que abandonar suas casas. Foram expulsos palestinos muçulmanos, cristãos e mesmo judeus que não concordavam com a filosofia sionista que projetava a criação de um Estado exclusivamente judeu. Mais de 400 vilarejos foram destruídos para dar lugar à colonização israelense.

Em Brasília, o Dia da Catástrofe Palestina será lembrado na embaixada onde os visitantes poderão assinar o Livro da Solidariedade. Em São Paulo, um ato público chamado 67 anos da Nakba: lembrar e resistir está marcado para o fim da tarde de hoje, na Avenida Paulista.

Hoje, cerca de 60% da população palestina vive na condição de refugiada – cerca de 5,5 milhões de pessoas que foram morar ou nasceram em campos de refugiados em países vizinhos, como a Jordânia, a Síria e o Líbano e dentro do próprio território palestino. Sob os cuidados da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (Unrwa) há 58 campos. Uma chave, que representa a promessa de retorno à Palestina, é o símbolo da luta dessas pessoas.

Abu Haitham El Azi, 80 anos, vive em um desses campos de refugiados em Aman, capital da Jordânia. Ele foi expulso de sua casa em um vilarejo próximo a Gaza quando tinha 13 anos.  “Minha cidade foi destruída, mas meu pai se recusou a sair de casa. Foi tirado à força e o levaram para Hebron [cidade histórica no território palestino que fica a cerca de 40 quilômetros da cidade natal de Abu que virou território israelense]. Os sionistas roubaram minha casa, minha terra. Se eles me aceitassem, poderíamos viver juntos sem problema nenhum. Eu daria metade da minha casa para eles. Mas eles nos tratam como carneiro [criação animal predominante na Palestina. O mesmo que ‘gado’, no Brasil]. Nem um cachorro, na Europa, vive nas condições que a gente vive hoje”, disse El Azi, lembrando o motivo de a data ser lembrada como catástrofe.

A Empresa Brasil de Comunicação (EBC) esteve na casa de Abu El Azi enquanto acompanhava a Missão Humanitária do Fórum Social Mundial a Gaza, em abril. O grupo não teve autorização para entrar na região bloqueada, mas visitou o território palestino ocupado da Cisjordânia e os campos de refugiados do país vizinho, a Jordânia.

Como refugiados, os palestinos vivem situações difíceis nos países que os abrigam. Enfrentam dificuldades para encontrar emprego e ter acesso à saúde e educação. Como refugiados dentro da própria Palestina também enfrentam o desemprego, a escassez de água, restrições de mobilidade, com bloqueios de estradas e a violência das forças de segurança de Israel.

“Imagina se te roubam sua terra, sua casa, sua vida, qual seria a reação de vocês? Quando eu lembro meus amigos, minhas amigas, meus irmãos, minhas irmãs, eu fico pensando: para onde eles foram? Onde eles foram parar? Que caminho cada um tomou? A gente fica revoltado com essa situação”, lembra El Azi.

Na parede de casa, ele mantém um quadro feito com sua árvore genealógica. Apesar dos numerosos parentes, ele vive sozinho. Dos seis irmãos, tem notícia apenas de um. “Ele estudou e é advogado na Cisjordânia [território palestino que faz fronteira com a Jordânia]”, explica. Abu El Azi não tem autorização para entrar na Palestina. Desde que foi expulso, só conseguiu retornar uma vez, em 1965. Por isso, não pode ver o irmão.

Apesar das lágrimas, Abu rejeita a piedade. As barbas brancas e os trajes escondem o jovem que resistiu à colonização lutando na guerrilha. “Não choro por minha fraqueza. Se eu puder, eu carrego a metralhadora e volto a lutar para recuperar minha terra, porque ela é minha vida. Mesmo não gostando de matar, mesmo não gostando de agredir, é preciso lutar.”

Ele faz questão de mostrar a chave feita em latão com cerca de três metros de comprimento que ocupa o lugar de escultura em uma praça em frente ao campo de refugiados de Aman. Ele acredita que, se voltasse hoje à Palestina, seria preso por causa da atuação na guerrilha nos anos 60. Mesmo assim, não deixa de acreditar no retorno. “Eu não tenho esperança, eu tenho 101% de certeza que vou voltar.”

Abu El Azi segue atento às disputas políticas no Oriente Médio, critica os governantes árabes a quem chama de “serviçais dos sionistas” e tem sua própria leitura da Primavera Árabe, a onda revolucionária que desde 2010 tem mexido com o cenário político da região. “Quando um regime oprime e reprime isso estoura. Não porque era uma Primavera Árabe, mas porque o povo explodiu e reagiu. Imagine um governo que fica 30, 40 anos no poder, o que ele pode te dar? Fome e opressão. Se três carneiros derrubam uma ditadura, imagina o povo?”, pergunta.

A catástrofe para o povo palestino não ficou restrita a 1948. Entre 1967 e 1981, mais 120 mil palestinos tiveram que deixar o país, logo após a vitória de Israel na Guerra dos Seis Dias.

A disputa definiu as novas fronteiras entre Israel e Palestina. Gaza ficou restrita a uma faixa de 40 quilômetros de comprimento por 10 de largura e Jerusalém, cidade de importância histórica e cultural para muçulmanos, árabes e judeus, foi anexada a Israel. Até então, ela ficava exclusivamente na Cisjordânia, território palestino. Tanto Israel quanto a Autoridade Palestina reivindicam Jerusalém como capital. Hoje, a cidade é dividida em duas partes: Jerusalém Ocidental, sob administração israelense, e Jerusalém Oriental, teoricamente, sob comando da Autoridade Palestina, mas com absoluto controle de Israel sobre quem entra em quem sai da cidade.

Em 1987, ocorreu a primeira Intifada, levante popular marcado pelo pacifismo e que anos mais tarde, em 1993, resultou na assinatura do Acordo de Paz de Oslo. Yitzhak Rabin, por Israel, e Yasser Arafat, representante da Organização pela Libertação da Palestina, assinaram o tratado em Washington, na presença do então presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton.

O acordo previa a criação do Estado da Palestina no prazo de cinco anos, o que não ocorreu. As fronteiras que definiriam os limites entre os dois países seriam as de 1967, estabelecidas com a vitória de Israel na Guerra dos Seis Dias.

Em setembro de 2000, a revolta do povo palestino cresceu. Surgiu, no cenário político, um novo partido, o Hamas, que não reconhece a criação do Estado de Israel e inicia uma forte resistência marcada pela violência. Notícias sobre homens-bombas e explosões de cafés e restaurantes em Tel Aviv e outras cidades israelenses marcaram o final do século 20. No Ocidente, o povo árabe passa a ser cada vez mais associado ao terrorismo. No Oriente, os ataques são compreendidos como uma forma de resistência legítima após anos de opressão.

A resposta de Israel não demorou a chegar e um muro – duas vezes mais alto e três vezes mais extenso que o Muro de Berlim – é construído para dividir Israel da Palestina, sem respeitar os limites de 1967 e invadindo o território palestino.

O cotidiano da população palestina passou a ser marcado pela existência de bases militares de controle, estradas exclusivas – nas quais só podem circular israelenses – e a necessidade de ter permissão para circular entre cidades. Em 2007, após a vitória do Hamas, partido político considerado terrorista por Israel, a Faixa de Gaza foi bloqueada e cresceram as restrições de mobilidade do povo palestino. A desobediência é punida com cadeia. Hoje, cerca de 6 mil palestinos encontram-se na condição de presos políticos de Israel.

Em 2010, o Brasil reconhece o Estado da Palestina. Em 2012, é a vez de as Nações Unidas reconhecerem a Palestina como Estado. Na última terça-feira (12), o Vaticano tomou a mesma decisão. Ao todo, 135 países das Nações Unidas reconhecem o Estado Palestino.

No entanto, o movimento de ocupação do território segue por parte do governo de Israel. Uma das promessas que reconduziu Benjamin Netanyahu ao posto de primeiro-ministro de Israel foi a de que sob seu governo o Estado da Palestina nunca seria concretizado. Netanyahu integra ao Likud, partido israelense de extrema-direita.

Hoje, cerca de 60% da população palestina vive na condição de refugiada – cerca de 5,5 milhões de pessoas que foram morar ou nasceram em campos de refugiados em países vizinhos, como a Jordânia, a Síria e o Líbano e dentro do próprio território palestino. Sob os cuidados da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (Unrwa) há 58 campos. Uma chave, que representa a promessa de retorno à Palestina, é o símbolo da luta dessas pessoas. Moustafá Baghouti, presidente da Iniciativa Nacional Palestina, partido que busca se firmar como alternativa ao Fatah e ao Hamas. Moustafá foi entrevistado em Ramalah na Cisjordânia pela jornalista Eliane Gonçalves da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) que acompanhou a visita de uma missão humanitária à Palestina.